a questão referente à prova do crime antecedente e o quanto a sua
definição exata e definitiva se insere na tipicidade do crime de lavagem de
dinheiro constituem pontos que nos parecem superados pela melhor doutrina,
no sentido de que vigem, na Lei 9.613/1998, os princípios: a) da independência das instruções (art. 2°, 11) e b) da acessoriedade material limitada
em face do crime antecedente, a qual restringe o aplicador da lei à
necessidade do conhecimento da sua existência, mas dispensa o conhecimento da sua autoria e o da culpabilidade do' agente (art. 2°, § 1°, segunda parte)
Já tivemos a oportunidade de escrever, entretanto, que, dada a complexidade do crime de lavagem de dinheiro, parece-nos que o legislador
nacional procurou conceber uma tipicidade, a mais ampla e completapossível que abarcasse tanto as formas mais genéricas de conduta comoaquelas que, especificamente, visassem a mascarar a utilização de bens,
direitos ou valores provenientes dos ilfcitos penais contemplados.
Daí a orientação de alguns autoresde que se trata de crime de mera conduta. " Contudo, parece-nos que, em tese,
a tentativa seria admissível também nessa modalidade, nas mesmas condi-
çôes acima observadas, o que levaria essa figura típica, como as demais, amanter as características de crime formal
A idéia de participar de um grupo, associação ou escritório
revela que a estabilidade dessa relação é inerente à consumação. Por outrolado, a expressão "associação" não tem o caráter das sociedades constituídaspara cometer crimes, como as do art. 288 do CP, haja vista que a lavagem
pode ser apenas uma das atividades - principal ou secundária da associação
aqui tratada, bem como do grupo ou do escritório. Por essa razão, o art. 1°,
§ 2°, 11 da Lei n. 9.613/98 não se confunde e não exclui a aplicação do art.
288 do CP aos casos de formação de quadrilha ou bando para o fim de
praticar os crimes de lavagem de dinheiro.
dada a existência de núcleosvariados de conduta dos tipos penais que o punem, encerrará sua consumação
em qualquer daquelas fases, não se deixando de considerar que as mais
próximas do último instante da conduta prevalecem sobre as mais próximas
do seu início.
A princípio, seria possível pensar numa forma continuada de prática dainfração penal , por intermédio de vários atos que se podem decompor. Só
que, nesse caso, haveria enorme iniqüidade, pois se o agente optasse porocultar de uma só vez todo o montante, responderia por um único crimeinstantâneo ao passo que se procurasse ocultar empequenas partes o referido valor, acabaria respondendo com o acréscimo depena da continuidade delitiva.
É interessante notar que a existência do crime antecedente, dandoorigem aos valores a serem lavados, interfere diretamente no exame e
conclusão da conduta típica praticada, até mesmo para efeitos de constatar,
se o grupo de atos utilizados, integram uma mesma conduta unitária.
omo os valores a serem ocultados derivam da venda de
parcelas da mesma quantidade de droga que o agente adquiriu anteriormentepara colocar à disposição do mercado clandestino, preferimos entender, 'numa primeira análise desse tema, que se está diante de um único crime de
lavagem de dinheiro. Quer em relação a cada depósito parcelado daquele
montante, quer em relação aos valores que continuam no estabelecimento
aguardando o momento de serem depositados, 'haverá só um crime, que se
consumará uma só vez em relação ao episódio antecedente, que gerou oproveito parcelado dos valores.
após ganhar muito
dinheiro por meio de uma atividade lícita econômica, resolva remeter grandeparte desses recursos para fora do País de forma clandestina, por nãoacreditar na estabilidade da economia nacional em médio prazo. O queimporta detectar, de imediato, nessa conduta de remessa de recursos para fora
do País de forma clandestina - que é o pressuposto de fato para a incidência
da norma penal adequada é o conteúdo delitivo existente diante da valoraçãonormativa realizada. E logo se perceberá, com exatidão, que ele se restringe
à evasão de divisas, delito capitulado no art. 22, parágrafo único, da Lei
7.492/1986. Afinal, a atividade antecedente era lícita.Mas pode ocorrer que o mesmo indivíduo "B" tenha obtido aqueles
recursos por meio do tráfico ilícito de entorpecentes e os remeta para fora do
País com vistas, num primeiro momento, a dissimular a sua origem, paraintroduzi-los, num segundo e próximo momento, no Brasil. Nesse caso,
inclinamo-nos por entender, numa primeira análise, que o pressuposto de fatotem apenas um conteúdo delitivo que se insere exatamente naquele eleito
pela norma do art. 10 da Lei 9.613/1998, a qual, pelo princípio da especialidade, deverá prevalecer sozinha sobre a do art. 22, parágrafo único, da Lei7.492/1986.
Paralelo a isso,uma vez no exterior, lá o sujeito mantém os depósitos, para reinvesti-Ios em
atividades econõmicas e aplicações financeiras. Nesse caso, o exame da
situação hipotética permite constatar mais de um pressuposto de fato commais de um conteúdo delitivo, pois que há a remessa para o exterior por meio
de várias contas e instituições financeiras para ocultar ou dissimular a origemilícita dos valores, e ainda se identifica a manutenção de depósitos no
exterior sem comunicação às autoridades federais. Aqui a incidência dasregras do concurso de crimes parece ser a solução adequada para punir osfatos apurados, impedindo a impunidade de algum dos conteúdos delitivosneles identificados.