sexta-feira, 30 de outubro de 2020

EDIÇÃO N. 159: LEI DE EXECUÇÃO FISCAL - VI

 Os entendimentos foram extraídos de julgados publicados até 16/10/2020

Informativo n.º 996 - STF


O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) incidente nas operações de importação de mercadorias tem como sujeito ativo o estado em que localizado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário jurídico da mercadoria importada. A conclusão acerca de quem será o destinatário jurídico do bem depende da análise do negócio jurídico entabulado entre as partes e das circunstâncias fáticas do caso concreto.

De acordo com o art. 155, II, da Constituição Federal (CF), o critério material de incidência do ICMS é a realização de operações relativas à circulação de mercadoria, ainda que as operações se iniciem no exterior, tendo o § 2º, IX, a (1), do mesmo artigo completado que o imposto incidirá também sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior. O aspecto material do fato gerador do ICMS incidente na importação é a circulação de mercadoria, caracterizada pela transferência do domínio (compra e venda), com a consequente entrada no território nacional de bem ou mercadoria advinda do exterior. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que não é a mera entrada da mercadoria no território nacional que enseja a incidência do ICMS-importação, pois deve haver circulação econômico-jurídica da mercadoria com transferência de domínio.

O desembaraço aduaneiro refere-se ao aspecto temporal do fato gerador da obrigação tributária, momento em que o tributo passa a ser exigível, entendimento que, inclusive é objeto da Súmula Vinculante 48 do STF.

O sujeito ativo competente para a instituição do ICMS-importação são os estados e o Distrito Federal, nos moldes do citado art. 155, II, da CF, que receberão as prestações pecuniárias relativas às operações de importação que se realizem nos limites do seu território. De acordo com o art. 4º da Lei Complementar (LC) 87/1996 (Lei Kandir), contribuinte é aquele que promove a importação, a qualquer título. Entre os Estados, conforme a redação do art. 155, § 2º, IX, a, da CF, o imposto caberá àquele onde estiver situado o domicílio ou estabelecimento do destinatário da mercadoria ou do bem. No entanto, a Constituição Federal não definiu qual deve ser considerado o estabelecimento destinatário da mercadoria.

Uma interpretação literal da previsão contida no art. 11, I, d, da LC 87/1996 (2) poderia levar o intérprete a considerar como estabelecimento destinatário meramente aquele estado onde ocorreu o desembaraço aduaneiro. Ocorre que essa interpretação é incabível, visto que confunde o aspecto temporal do fato gerador (momento em que o tributo passa a ser exigível) com a sujeição exacional passiva, além de desconsiderar o próprio fato jurídico da importação, o que não se coaduna com o texto constitucional. De fato, a jurisprudência desta Corte já se posicionou sobre essa questão no sentido de considerar que o destinatário é o destinatário econômico-jurídico do bem; e de que o local do desembaraço aduaneiro não se confunde com o local do destinatário jurídico da importação, ainda que possam ser faticamente o mesmo.

Na importação própria, sob encomenda, o destinatário jurídico da mercadoria é o estabelecimento importador.

A Secretaria da Receita Federal do Brasil admite três formas de importação de bens do exterior: por conta própria, por conta e ordem de terceiro e por encomenda. Na importação por conta própria, a importadora adquire bens no exterior em seu nome e os revende posteriormente para terceiros. Nessa hipótese, existem dois contratos de compra e venda: um entre o fornecedor estrangeiro e o importador, e outro entre o importador e o adquirente no mercado interno. Nessa situação, a venda do bem no mercado interno é negócio jurídico estranho à importação, pois a importadora possui a livre disponibilidade do bem para dar a ele a procedência que melhor lhe aprouver. Já na importação por conta e ordem de terceiros, o adquirente da mercadoria importada contrata empresa intermediária, prestadora de serviço para que promova, por conta e ordem da contratante, o despacho de importação da mercadoria em nome desta. Aqui, a empresa importadora é mera prestadora de serviços, sendo claro que o real importador é o adquirente da mercadoria.

A importação por encomenda se equipara, para a maioria da doutrina, à importação por conta própria, tendo em vista que a importadora ou trading não é uma mera intermediária ou prestadora de serviço; nas duas hipóteses, o importador realiza duas operações: a primeira relativa à importação de mercadoria do exterior em seu próprio nome, e a segunda (em decorrência ou não de encomenda), relativa à venda desse bem ou mercadoria no mercado interno. Nesses casos, em que ocorrem duas operações, haverá, consequentemente, duas hipóteses de incidência do ICMS: uma referente ao fato jurídico da importação do bem, na qual deverá ser cobrado o ICMS-importação previsto no art. 155, § 2º, IX, a, da CF, e a outra concernente à posterior venda desse mesmo bem no mercado interno, momento em que incidirá a regra constante do caput do art. 155.

Ou seja, na importação própria, sob encomenda, a importadora não é mera intermediária do consumidor interno ou simples prestadora de serviço, porque atua por conta própria, negociando e internalizando o bem no mercado para posterior revenda, independentemente de esta ter sido negociada antes ou depois da importação. Por isso, nessa hipótese, o destinatário jurídico da mercadoria é o estabelecimento importador.

O fato de o gás natural não poder ser estocado no estabelecimento do importador não altera a sujeição exacional ativa e passiva do ICMS-importação.

A circulação que importa para a hipótese de incidência do ICMS é a circulação econômico-jurídica de bens, o que significa a alteração da titularidade sem que seja necessário o deslocamento físico da mercadoria. A própria LC 87/1996 contempla a figura da circulação jurídica ou simbólica (art. 12) e dispensa, em seu art. 20 (3), a entrada física dos bens no estabelecimento para que ocorra a compensação do imposto. Ou seja, de acordo com essa previsão, o direito de crédito existe a partir da circulação jurídica de bens, independentemente da ocorrência de circulação física.

No que se refere ao gás natural, devido a sua composição química, é impossível, fisicamente, a armazenagem e estocagem no estabelecimento do importador. A transferência de gás natural em sua forma gasosa se opera de modo contínuo e sua alocação apenas é viável depois de submetida a processo de industrialização, quando assume a forma líquida e não mais gasosa. Acrescente-se que, o Plenário do STF, em sede de repercussão geral (Tema 520), declarou a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto do art. 11, I, d, da LC 87/1996, para afastar o entendimento segundo o qual o local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável pelo tributo, seria apenas o da entrada física do bem importado, tendo em vista, exatamente a juridicidade de circulação ficta de mercadoria, desde que haja efetivo negócio jurídico.

No caso, mediante contrato de importação própria, sob encomenda, estabelecimento da Petrobras, localizado em Corumbá/MS, adquire gás natural diretamente de empresa na Bolívia. O gás é entregue à Petrobras no ponto em que ocorre a sua entrada no território nacional, naquele município. Há a transferência da titularidade jurídica do bem, na qual o gás sai da esfera jurídica da empresa boliviana e passa à titularidade da Petrobras e, somente uma vez internalizado, passa a ser de domínio das empresas situadas nos territórios dos estados requeridos, ocorrendo, dessa forma, dois negócios jurídicos com dupla incidência tributária.

Com esse entendimento o Plenário, por maioria, julgou procedentes pedidos formulados em ações cíveis originárias, para, reconhecendo a sujeição ativa exacional do estado de Mato Grosso do Sul, envolvendo os atuais contratos de importação de gás natural da Bolívia do gasoduto Gasbol, determinar aos estados de Santa Catarina, de São Paulo e do Rio Grande do Sul que se abstenham de formular qualquer tipo de autuação ou lançamento tributário do ICMS incidente sobre as operações de importação de gás natural advindo da Bolívia e realizada pela Petrobras - Corumbá/MS; e de prosseguirem com as cobranças já iniciadas. Vencidos os ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Marco Aurélio e Rosa Weber que julgaram os pedidos improcedentes.


 

Ante o postulado da separação de Poderes, o Congresso Nacional não pode autorizar, atuando de forma abstrata e genérica, a distribuição de medicamento.

Compete à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) permitir a distribuição de substâncias químicas, segundo protocolos cientificamente validados. O controle dos medicamentos fornecidos à população leva em conta a imprescindibilidade de aparato técnico especializado, supervisionado pelo Poder Executivo.

A Constituição Federal (CF) reservou aos parlamentares instrumentos adequados à averiguação do correto funcionamento das instituições pátrias, quais sejam, convocação de autoridade a fim de prestar esclarecimentos e instauração de comissão parlamentar de inquérito. Porém, surge impróprio aos parlamentares substituírem agência subordinada ao Poder Executivo.

O direito à saúde não será plenamente concretizado se o Estado deixar de cumprir a obrigação de assegurar a qualidade de droga mediante rigoroso crivo científico, apto a afastar desengano, charlatanismo e efeito prejudicial.

Ao elaborar a Lei 13.269/2016, o Congresso Nacional, permitindo a distribuição de remédio sem controle prévio da viabilidade sanitária, omitiu-se no dever constitucional de tutelar a saúde da população. A aprovação do produto no órgão do Ministério da Saúde é exigência para industrialização, comercialização e importação com fins comerciais (Lei 6.360/1976, art. 12).

O diploma impugnado suprime, casuisticamente, o requisito de registro sanitário. Isso evidencia que o legislador deixou em segundo plano a obrigação de implementar políticas públicas voltadas à garantia da saúde. A oferta de medicamento, embora essencial à concretização do Estado Social de Direito, não pode ser conduzida à margem do figurino constitucional, com atropelo dos pressupostos mínimos de segurança visando o consumo, sob pena de esvaziar-se, por via transversa, o próprio conteúdo do direito fundamental à saúde [CF, art. 196 (1)].

É no mínimo temerária e potencialmente danosa a liberação genérica do tratamento sem realização dos estudos clínicos correspondentes, em razão da ausência de elementos técnicos assertivos da viabilidade da substância para o bem-estar.

Trata-se, na espécie, de ação direta de inconstitucionalidade apresentada pela Associação Médica Brasileira em face da Lei 13.269/2016, que autorizava o uso da fosfoetanolamina sintética por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna.

O Plenário, por maioria, confirmou medida cautelar (Informativo 826) e julgou procedente o pedido formulado para declarar a inconstitucionalidade da aludida lei. Vencidos os ministros Edson Fachin, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, que conferiram interpretação conforme à CF ao art. 2º da referida norma.

É inconstitucional o art. 1º da Resolução 20/2001 do Comitê Gestor do Programa de Recuperação Fiscal (CG/Refis) (1), no que suprimiu a notificação da pessoa jurídica optante do Refis, prévia ao ato de exclusão.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) tem constantemente reafirmado a garantia da plenitude de defesa como uma pretensão à tutela jurídica. A garantia da pretensão à tutela jurídica — albergada no art. 5º, LV, da CF (2) — envolve não só o direito de manifestação e de informação sobre o objeto do processo, mas também o direito de ver seus argumentos contemplados pelo órgão julgador.

O exercício da autotutela estatal deve ocorrer por meio de procedimento administrativo que confira àqueles que eventualmente venham a ser atingidos pela decisão invalidatória oportunidade de manifestação prévia, observados os desdobramentos da ampla defesa [Tema 138 da Repercussão Geral (RG), RE 594.296].

Nesse sentido, é obrigatória a notificação prévia do contribuinte, antes da apreciação da representação, para que ele possa se manifestar sobre as irregularidades nela apontadas. Além disso, deve ser dado ao interessado a oportunidade para exercer sua defesa contra o ato de exclusão do Refis. Esse ato tem caráter individual e afeta diretamente o contribuinte em sua esfera particular de direitos. Ademais, considerações particulares, em tese, podem ter potencial para interferir na deliberação a ser adotada pelo Conselho Gestor. Quer dizer, há necessidade de apreciação da situação particularizada do contribuinte.

Trata-se, no caso, de controvérsia centrada na falta de intimação prévia de contribuinte, pessoa jurídica, sobre o ato de exclusão do Refis, na ausência de observância dos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, bem como nas garantias estabelecidas no art. 37 da CF (3). Não foi objeto de análise a matéria referente à validade do ato de exclusão do Refis, restrita à forma de notificação e à possibilidade de ser realizada pela imprensa oficial ou pela internet [Tema 291 RG, RE 611.230].

Com esse entendimento, ao apreciar o Tema 668 RG, o Plenário negou provimento a recurso extraordinário.

Inexistindo comprovação da ausência de urgência, não há espaço para atuação do Poder Judiciário no controle dos requisitos de edição de medida provisória pelo chefe do Poder Executivo.

Apesar de a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) ter se consolidado no sentido da possibilidade de controle judicial dos pressupostos de relevância e urgência para a edição de medidas provisórias, “o escrutínio a ser feito pelo Judiciário neste particular é de domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal desses requisitos” (RE 592.377).

A forma de se realizar esse controle deve depender da motivação apresentada pelo chefe do Poder Executivo. “A motivação, embora não seja requisito constitucional expresso, facilita o controle da legitimidade e dos requisitos constitucionais autorizadores, seja pelo Legislativo, seja pelo Judiciário”. Existindo motivação, ainda que a parte não concorde com os motivos explicitados pelo Presidente da República para justificar a urgência da medida provisória, não se pode dizer que eles não foram apresentados e defendidos pelo órgão competente.

Ressalte-se que, na hipótese, não se está a proceder juízo de mérito quanto aos argumentos utilizados para justificar a urgência na edição da medida provisória, mas tão somente verificar a legitimidade de tais argumentos, para assim realizar ou não a intervenção judicial almejada pela parte.

No caso, trata-se de ação direta de inconstitucionalidade com pedido de medida cautelar, em face da Medida Provisória 746/2016.

Com esse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente o pedido formulado na ação direta de inconstitucionalidade.

É constitucional a delegação do poder de polícia, por meio de lei, a pessoas jurídicas de direito privado integrantes da Administração Pública indireta de capital social majoritariamente público que prestem exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial.

O fato de a pessoa jurídica integrante da Administração Pública indireta destinatária da delegação da atividade de polícia administrativa ser constituída sob a roupagem do regime privado não a impede de exercer a função pública de polícia administrativa.

O regime jurídico híbrido das estatais prestadoras de serviço público em regime de monopólio é plenamente compatível com a delegação, nos mesmos termos em que se admite a constitucionalidade do exercício delegado de atividade de polícia por entidades de regime jurídico de direito público. Isso porque a incidência de normas de direito público em relação àquelas entidades da Administração indireta tem o condão de as aproximar do regime de direito público, do regime fazendário e acabar por desempenhar atividade própria do Estado.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao desdobrar o ciclo de polícia, entende que somente os atos relativos ao consentimento e à fiscalização são delegáveis, pois aqueles referentes à legislação e à sanção derivam do poder de coerção do Poder Público. Segundo a teoria do ciclo de polícia, o atributo da coercibilidade é identificado na fase de sanção de polícia e caracteriza-se pela aptidão que o ato de polícia possui de criar unilateralmente uma obrigação a ser adimplida pelo seu destinatário.

Apesar da substancialidade da tese, verifica-se que, em relação às estatais prestadoras de serviço público de atuação própria do Estado e em regime de monopólio, não há razão para o afastamento do atributo da coercibilidade inerente ao exercício do poder de polícia, sob pena de esvaziamento da finalidade para a qual aquelas entidades foram criadas.

A Constituição da República, ao autorizar a criação de empresas públicas e sociedades de economia mista que tenham por objeto exclusivo a prestação de serviços públicos de atuação típica do Estado, autoriza, consequentemente, a delegação dos meios necessários à realização do serviço público delegado, sob pena de restar inviabilizada a atuação dessas entidades na prestação de serviços públicos.

Por outro lado, cumpre ressaltar a única fase do ciclo de polícia que, por sua natureza, é absolutamente indelegável: a ordem de polícia, ou seja, a função legislativa. A competência legislativa é restrita aos entes públicos previstos na Constituição da República, sendo vedada sua delegação, fora das hipóteses expressamente autorizadas no tecido constitucional, a pessoas jurídicas de direito privado.

Em suma, os atos de consentimento, de fiscalização e de aplicação de sanções podem ser delegados a estatais que possam ter um regime jurídico próximo daquele aplicável à Fazenda Pública.

Na espécie, cuida-se de recurso extraordinário contra acórdão do STJ o qual prestigiou a tese de que somente os atos relativos ao consentimento e à fiscalização seriam delegáveis.

Diante disso, o Tribunal, por maioria, ao apreciar o Tema 532 da repercussão geral, conheceu e deu provimento a recurso extraordinário para reconhecer a compatibilidade constitucional da delegação da atividade de policiamento de trânsito à empresa, nos limites da tese jurídica objetivamente fixada pelo Pleno.

Tem direito à substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliardesde que observados os requisitos do art. 318 do Código de Processo Penal (CPP) (1) e não praticados crimes mediante violência ou grave ameaça ou contra os próprios filhos ou dependentes — os pais, caso sejam os únicos responsáveis pelos cuidados de menor de 12 anos ou de pessoa com deficiência, bem como outras pessoas presas, que não sejam a mãe ou o pai, se forem imprescindíveis aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 anos ou com deficiência.

Em observância à proteção integral e à prioridade absoluta conferidas pela Constituição Federal de 1988 (CF) às crianças e às pessoas com deficiência, é cabível a substituição da prisão preventiva em prisão domiciliar, nos casos dos incisos III e VI do art. 318 do CPP, quando o contexto familiar do investigado ou réu demonstrar a sua importância para a criação, o suporte, o cuidado e o desenvolvimento de criança ou pessoa com deficiência, bem como em decorrência das atuais circunstâncias de grave crise na saúde pública nacional que geram riscos mais elevados às pessoas inseridas no sistema penitenciário, em especial em razão da proliferação do Coronavírus (Covid-19) no Brasil.

Eventual recusa à substituição deve ser amplamente fundamentada pelo magistrado e só deve ocorrer em casos graves, tais como a prática pelo acusado de crime com violência ou grave ameaça à pessoa ou a prática de delitos contra sua própria prole.

Ressalte-se que o art. 318, VI, do CPP, prevê expressamente que, nos casos de presos do sexo masculino, o juiz deverá substituir a prisão preventiva pela domiciliar caso ele seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos. Em se tratando de outras pessoas presas que não sejam a mãe ou o pai, o inciso III estabelece que deverá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar se o preso for imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência.

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma concedeu a ordem de habeas corpus coletivo.


DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO TRIBUTÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO EMPREGADOR. INCIDÊNCIA SOBRE O SALÁRIO-MATERNIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL. 1. Recurso extraordinário interposto em face de acórdão do TRF da 4ª Região, que entendeu pela constitucionalidade da incidência da contribuição previdenciária “patronal” sobre o salário-maternidade. 2. O salário-maternidade é prestação previdenciária paga pela Previdência Social à segurada durante os cento e vinte dias em que permanece afastada do trabalho em decorrência da licença-maternidade. Configura, portanto, verdadeiro benefício previdenciário. 3. Por não se tratar de contraprestação pelo trabalho ou de retribuição em razão do contrato de trabalho, o salário-maternidade não se amolda ao conceito de folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício. Como consequência, não pode compor a base de cálculo da contribuição previdenciária a cargo do empregador, não encontrando fundamento no art. 195, I, a, da Constituição. Qualquer incidência não prevista no referido dispositivo constitucional configura fonte de custeio alternativa, devendo estar prevista em lei complementar (art. 195, §4º). Inconstitucionalidade formal do art. 28, §2º, e da parte final da alínea a, do §9º, da Lei nº 8.212/91. 4. Esta Corte já definiu que as disposições constitucionais são legitimadoras de um tratamento diferenciado às mulheres desde que a norma instituidora amplie direitos fundamentais e atenda ao princípio da proporcionalidade na compensação das diferenças. No entanto, no presente caso, as normas impugnadas, ao imporem tributação que incide somente quando a trabalhadora é mulher e mãe cria obstáculo geral à contratação de mulheres, por questões exclusivamente biológicas, uma vez que torna a maternidade um ônus. Tal discriminação não encontra amparo na Constituição, que, ao contrário, estabelece isonomia entre homens e mulheres, bem como a proteção à maternidade, à família e à inclusão da mulher no mercado de trabalho. Inconstitucionalidade material dos referidos dispositivos. 5. Diante do exposto, dou provimento ao recurso extraordinário para declarar, incidentalmente, a inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade, prevista no art. art. 28, §2º, e da parte final da alínea a, do §9º, da Lei nº 8.212/91, e proponho a fixação da seguinte tese: “É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário- maternidade”.


PIS E COFINS – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA – ARTIGO 150, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERALRECOLHIMENTO A MAIOR – DEVOLUÇÃO. É devida a restituição da diferença das contribuições para o Programa de Integração Social – PIS e para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins pagas a mais, no regime de substituição tributária, se a base de cálculo efetiva das operações for inferior à presumida.


RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 358. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSO AUTÔNOMO DE PERDA DE POSTO E PATENTE DE MILITAR. COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL PARA DECIDIR SOBRE QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE REFORMA AO POLICIAL AFASTADO. 1. Cuida-se, na origem, de Representação apresentada perante Tribunal de Justiça, mediante a qual se requereu a perda da graduação da praça e a exclusão dos quadros da polícia militar de agente policial condenado pela prática dos crimes de concussão e prevaricação. 2. O Tribunal de origem julgou parcialmente procedente a Representação, no sentido de se decretar a reforma disciplinar do policial em questão, com proventos proporcionais ao tempo de serviço. O afastamento da corporação fundamentou-se no fato de que sua conduta ofendeu o decoro da classe e o pundonor policial militar. Por outro lado, considerando que, por mais de vinte anos de atividade na corporação, não registrava sanções disciplinares e constavam em seu favor inúmeros elogios e medalhas por serviços prestados, o Tribunal decidiu conceder-lhe o benefício previdenciário. 3. O art. 102 do Código Penal Militar (Decreto-Lei 1.001, de 21 de outubro de 1969) estabelece que a condenação da praça à pena privativa de liberdade, por tempo superior a 2 (dois) anos, importa sua exclusão das Forças Armadas. 4. O art. 125, § 4º, da Constituição de 1988 dispõe que “compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças”. 5. O texto constitucional não recepcionou o art. 102 do Código Penal Militar em relação aos Policiais Militares, exigindo para esses, no campo judicial, a incidência do procedimento previsto pelo artigo 125, §4º da CF. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a possibilidade de perda de graduação dos praças das policias militares em virtude de decisão do Tribunal competente, mediante procedimento específico. 6. A previsão constitucional dessa específica competência para os Tribunais não afastou as tradicionais competências administrativas no âmbito da própria corporação, inclusive a possibilidade de sanção de perda da graduação, aplicada após procedimento administrativo, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa. 7. Em relação à questão constitucional com repercussão geral reconhecida, a Constituição não conferiu aos Tribunais competência para dispor sobre outras penas arroladas no Código Penal Militar, ou sobre questões administrativas e previdenciárias, que seguem sendo afeitas ao âmbito da corporação. 8. A reforma do militar é questão estranha ao processo autônomo de perda de posto e patente de militar, e está fora do âmbito de competência atribuído pela Constituição Federal, no art. 125, § 4º, ao Poder Judiciário. Assim, neste caso concreto, o acórdão recorrido, ao decidir pela reforma compulsória do militar, ofendeu não apenas o art. 125, § 4º, da Constituição Federal, como também o princípio da separação de poderes, por interferir em decisão administrativa, própria da Corporação. 9. Recurso extraordinário a que se dá provimento, para excluir a reforma concedida pelo acórdão recorrido. Tese de repercussão geral: "A competência constitucional do tribunal para decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças é específica, nos termos do artigo 125, § 4º, não autorizando a concessão de reforma de policial militar julgado inapto a permanecer nas fileiras da corporação”.


RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 324. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS - IPI. CÁLCULO. ESTABELECIMENTO DE VALORES PRÉ-FIXADOS (“PAUTAS FISCAIS”). RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR. INEXISTÊNCIA. CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 3º DA LEI ORDINÁRIA 7.798/1989. 1. O Imposto sobre Produtos Industrializados, previsto nos artigos 153, IV e §3º, da Constituição Federal e 46 a 51 do CTN, é de competência da União e incide sobre o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo (art. 46, parágrafo único, do CTN). 2. O artigo 146, III, a, da CF/1988 dispõe que compete à lei complementar definir normas gerais acerca da definição de tributos e dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes. O Código Tributário Nacional (Lei 5.172/1966), recepcionado pela Constituição de 1988 como lei complementar, regulamentou o IPI, definindo que a base de cálculo do imposto é o valor da operação de que decorre a saída da mercadoria. 3. A Lei 7.798/1989, objeto de conversão da Medida Provisória 69, de 19 de junho de 1989, trouxe em seu artigo 3º que o Poder Executivo poderá estabelecer classes de valores a serem pagos a título de IPI, para determinadas bebidas e alimentos. 4. As chamadas “pautas fiscaisestabelecem valores de referência para a base de cálculo do imposto e têm como escopo facilitar a tributação e evitar a evasão fiscal. O Fisco utiliza valores pré-fixados para enquadramento do produto, buscando eliminar a possibilidade de manipulação dos preços da operação. 5. Tal mecanismo, enfim, facilita a fiscalização tributária e evita a sonegação fiscal. 6. A reserva legal no âmbito do direito tributário significa que todos os aspectos da regra matriz da hipótese de incidência tributária, seja os elementos antecedentes da norma (material, temporal e espacial), seja os consequentes (quantitativo e pessoal), devem ser taxativamente regulados por lei em sentido estrito. 7. Entretanto, tanto a doutrina tributária mais moderna, quanto esta CORTE SUPREMA, vêm empregando ideia mais flexível do princípio da legalidade tributária, permitindo, por vezes, o complemento de determinado aspecto da obrigação tributária mediante ato infralegal, desde que a lei trace limites à regulamentação pelo Executivo. 8. Quanto ao tema, veja-se trecho do voto do ilustre Min. DIAS TOFFOLI nos autos do RE 838.284 que, julgado sob o rito da repercussão geral (Tema 829), fixou a tese de que Não viola a legalidade tributária a lei que, prescrevendo o teto, possibilita o ato normativo infralegal fixar o valor de taxa em proporção razoável com os custos da atuação estatal, valor esse que não pode ser atualizado por ato do próprio conselho de fiscalização em percentual superior aos índices de correção monetária legalmente previstos. 9. A Lei 7.798/1989 tratou apenas de regulamentar o que já estava disposto no CTN, conceituando, portanto, o que seria valor da operação para fins de definição da base de cálculo do IPI. A legislação aplicável ao IPI cuidou de trazer todos os aspectos da regra matriz de incidência tributária, de forma que ao Poder Executivo foi delegada apenas a possibilidade de esmiuçar o conceito de valor da operação para fins de se determinar o valor de IPI a ser pago. 10. Não houve qualquer alteração da base de cálculo; apenas se instituiu uma técnica de tributação que leva em consideração o próprio valor da operação comumente verificada no mercado, em respeito, portanto, ao que determina o CTN. 11. Do mesmo modo, não há falar em usurpação do arquétipo constitucional e legal que regulamenta a matéria. Confirma esse entendimento o disposto no artigo 1º da Lei 8.218/1991, que, ao delegar ao Ministro da Economia, Fazenda e Planejamento a possibilidade de alterar os valores do IPI, impôs que a alteração deve se dar até o limite que corresponder ao que resultaria da aplicação da alíquota a que o produto estiver sujeito na TIPI sobre o valor tributável. 12. Assim, a instituição de classes de valores utiliza como parâmetro o preço convencional do produto (valor médio costumeiramente cobrado). Logo, é evidente que o preço do produto não perdeu seu caráter essencial na definição do valor a ser cobrado, o que demonstra a compatibilização da Lei 7.798/1989 com a sistemática do CTN. 13. Recurso extraordinário a que se dá provimento, para julgar improcedente o pedido inicial. Tese de repercussão geral: "É constitucional o artigo 3º da Lei 7.798/1989, que estabelece valores pré-fixados para o IPI".


quinta-feira, 29 de outubro de 2020

LEI Nº 14.076, DE 28 DE OUTUBRO DE 2020


Altera as Leis nos 9.440, de 14 de março de 1997, 9.826, de 23 de agosto de 1999, e 7.827, de 27 de setembro de 1989, a fim de prorrogar incentivos fiscais para o desenvolvimento regional, na forma que especifica.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º  O § 1º do art. 11-C da Lei nº 9.440, de 14 de março de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 11-C. ...................................................................................................

§ 1º Os novos projetos de que trata o caput deste artigo deverão ser apresentados até 31 de outubro de 2020 e deverão atender aos valores mínimos de investimentos realizados pela empresa habilitada na região incentivada no período de 1º de janeiro de 2021 a 31 de dezembro de 2025, na forma estabelecida pelo Poder Executivo federal.

............................................................................................................” (NR)

Art. 2º O § 3º do art. 1º da Lei nº 9.826, de 23 de agosto de 1999, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1º ........................................................................................................

......................................................................................................................

§ 3º O crédito presumido poderá ser aproveitado em relação às saídas ocorridas até 31 de dezembro de 2025.

........................................................................................................” (NR)

Art. 3º O art. 8º da Lei nº 7.827, de 27 de setembro de 1989, passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 1º e 2º:

“Art. 8º ........................................................................................................

§ 1º Para os efeitos do art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), a fim de compensar a renúncia de receita do crédito presumido de que trata o § 3º do art. 1º da Lei nº 9.826, de 23 de agosto de 1999, entre 1º de janeiro de 2021 e 31 de dezembro de 2025 será cobrado o Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários (IOF) sobre as operações de crédito praticadas com recursos do FCO, não aplicada a respectiva isenção de que trata o caput deste artigo.

§ 2º Relativamente às operações de crédito de que trata o § 1º deste artigo, a alíquota do IOF será a mesma alíquota incidente nas demais operações de crédito não isentas sujeitas ao referido imposto.” (NR)

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 

Brasília,  28  de outubro de 2020; 199o da Independência e 132o da República. 

JAIR MESSIAS BOLSONARO
Paulo Guedes

Este texto não substitui o publicado no DOU de 29.10 de 2020


quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Info 989 - STF - Dizer o Direito

 Não há impedimento, nem suspeição de ministro, nos julgamentos de ações de controle

concentrado, exceto se o próprio ministro firmar, por razões de foro íntimo, a sua não

participação.

STF. Plenário. ADI 6362/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 2/9/2020 (Info 989).

O art. 3º, caput, VII e § 7º, III, da Lei nº 13.979/2020 autoriza que os gestores locais de saúde (secretarias estaduais e municipais, p. ex.), mesmo sem autorização do Ministério da Saúde, façam a requisição de bens e serviços. O STF afirmou que esses dispositivos são constitucionais. Não se exige autorização do Ministério da Saúde para que os Estados-membros, Distrito Federal e Municípios decretem a requisição administrativa prevista no art. 3º, caput, VII e § 7º, III, da Lei nº 13.979/2020, no exercício de suas competências constitucionais. STF. Plenário. ADI 6362/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 2/9/2020 (Info 989).

Para que o Procurador do Estado possa propor ação civil pública (ex: ação civil pública de improbidade administrativa), não é necessária autorização do Govenador do Estado. No entanto, é indispensável a anuência do Procurador-Geral do Estado. STF. 1ª Turma. ARE 1165456 AgR/SE, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 1º/9/2020 (Info 989).

É constitucional a previsão em lei ordinária que introduz a sistemática da não-cumulatividade a COFINS dado que observa os princípios da legalidade, isonomia, capacidade contributiva global e não-confisco. STF. Plenário. RE 570122/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgado em 2/9/2020 (Repercussão Geral – Tema 34) (Info 989).


Boletim de Precedentes - STF n.º 138

 É constitucional a delegação do poder de polícia, por meio de lei, a pessoas jurídicas de direito privado integrantes da Administração Pública indireta de capital social majoritariamente público que prestem exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial

É inconstitucional o art. 1º da Resolução CG/REFIS nº 20/2001, no que suprimiu a notificação da pessoa jurídica optante do REFIS, prévia ao ato de exclusão

As disposições da Lei 9.656/1998, à luz do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como nos contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados.

É inconstitucional a incidência da contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário maternidade

Sempre que for pago ao trabalhador com vínculo permanente, o adicional de riscos é devido, nos mesmos termos, ao trabalhador portuário avulso

É devida a restituição da diferença das contribuições para o Programa de Integração Social - PIS e para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins recolhidas a mais, no regime de substituição tributária, se a base de cálculo efetiva das operações for inferior à presumida

É constitucional o artigo 3º da Lei 7.798/1989, que estabelece valores pré-fixados para o IPI

A competência constitucional do tribunal para decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças é específica, nos termos do artigo 125, § 4º, não autorizando a concessão de reforma de policial militar julgado inapto a permanecer nas fileiras da corporação


sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Informativo n.º 995 - STF

A inobservância do prazo nonagesimal do art. 316 do Código de Processo Penal (CPP) (1) não implica automática revogação da prisão preventiva, devendo o juízo competente ser instado a reavaliar a legalidade e a atualidade de seus fundamentos.

 

O disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP insere-se em um sistema a ser interpretado harmonicamente, sob pena de se produzirem incongruências deletérias à processualística e à efetividade da ordem penal. A exegese que se impõe é a que, à luz do caput do artigo, extrai-se a regra de que, para a revogação da prisão preventiva, o juiz deve fundamentar a decisão na insubsistência dos motivos que determinaram sua decretação, e não no mero decurso de prazos processuais.

O Supremo Tribunal Federal (STF) rechaça interpretações que associam, automaticamente, o excesso de prazo ao constrangimento ilegal da liberdade, tendo em vista: a) o critério de razoabilidade concreta da duração do processo, aferido à luz da complexidade de cada caso, considerados os recursos interpostos, a pluralidade de réus, crimes, testemunhas a serem ouvidas, provas periciais a serem produzidas, etc.; e b) o dever de motivação das decisões judiciais [Constituição Federal (CF), art. 93, IX] (2), que devem sempre se reportar às circunstâncias específicas dos casos concretos submetidos a julgamento, e não apenas aos textos abstratos das leis.

À luz desta compreensão jurisprudencial, o disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP não conduz à revogação automática da prisão preventiva. Ao estabelecer que “Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal”, o dispositivo não determina a revogação da prisão preventiva, mas a necessidade de fundamentá-la periodicamente.

Mais ainda: o parágrafo único do art. 316 não fala em prorrogação da prisão preventiva, não determina a renovação do título cautelar. Apenas dispõe sobre a necessidade de revisão dos fundamentos da sua manutenção. Logo, não se cuida de prazo prisional, mas prazo fixado para a prolação de decisão judicial.

Portanto, a ilegalidade decorrente da falta de revisão a cada 90 dias não produz o efeito automático da soltura, porquanto esta, à luz do caput do dispositivo, somente é possível mediante decisão fundamentada do órgão julgador, no sentido da ausência dos motivos autorizadores da cautela, e não do mero transcorrer do tempo.

No caso, trata-se de referendo de decisão do presidente do STF que, em sede de plantão judiciário, após reconhecer a existência de risco de grave lesão à ordem e à segurança pública, concedeu a suspensão de medida liminar proferida nos autos do HC 191.836/SP e determinou a imediata prisão do paciente. A periculosidade do agente do writ em foco para a segurança pública resta evidente, ante a gravidade concreta do crime (tráfico transnacional de mais de 4 toneladas de cocaína, mediante organização criminosa violenta e que ultrapassa as fronteiras nacionais) e a própria condição de liderança de organização criminosa de tráfico de drogas atribuída ao paciente, reconhecida nas condenações antecedentes que somam 25 anos.

Com esse entendimento, o Plenário, por maioria, referendou a decisão em suspensão de liminar, com a consequente confirmação da suspensão da decisão proferida nos autos do HC 191.836/SP até o julgamento do writ pelo órgão colegiado competente, determinando-se a imediata prisão do paciente, nos termos do voto do ministro Luiz Fux (presidente e relator), vencido o ministro Marco Aurélio, que inadmitia a possibilidade de presidente cassar individualmente decisão de um integrante do STF. O ministro Ricardo Lewandowski, preliminarmente, não conhecia da suspensão e, vencido, ratificou a liminar.


É constitucional a percepção de honorários de sucumbência por procuradores de estados-membros, observado o teto previsto no art. 37, XI, da Constituição Federal (CF) (1) no somatório total às demais verbas remuneratórias recebidas mensalmente.

Aplicam-se ao problema jurídico-constitucional os precedentes formados pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de ações diretas de inconstitucionalidade acerca da validade de textos legais que instituíram a percepção de honorários de sucumbência por advogados públicos, cujos conteúdos normativos são semelhantes (ADI 6.053, ADI 6.165, ADI 6.178).

A natureza constitucional dos serviços prestados pelos advogados públicos possibilita o recebimento da verba de honorários sucumbenciais, nos termos da lei, desde que submetido ao mencionado teto remuneratório. Restaram definidas cinco razões de decidir: (i) os honorários de sucumbência constituem vantagem de natureza remuneratória, por serviços prestados com eficiência no desempenho da função pública; (ii) os titulares dos honorários sucumbenciais são os profissionais da advocacia, seja pública ou privada; (iii) o art. 135 da CF (2), ao estabelecer que a remuneração dos procuradores estaduais se dá mediante subsídio, é compatível com o regramento constitucional referente à advocacia pública; (iv) a CF não institui incompatibilidade relevante que justifique vedação ao recebimento de honorários por advogados públicos, à exceção da magistratura e do Ministério Público; e (v) a percepção cumulativa de honorários sucumbenciais com outras parcelas remuneratórias impõe a observância do teto remuneratório estabelecido constitucionalmente no art. 37, XI.


As disposições da Lei 9.656/1998, à luz do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal (CF), somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como sobre os contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados.

 

Isso porque as relações jurídicas livremente pactuadas, com o uso da autonomia da vontade, devem dar valor à segurança jurídica, conferindo-se estabilidade aos direitos subjetivos e, mais ainda, conhecimento inequívoco das regras às quais todos estão vinculados, bem como a tão importante previsibilidade das consequências de suas respectivas condutas. Nesses termos, dentro do debate sobre a possibilidade de retroatividade da Lei 9.656/1998 a negócios jurídicos anteriores à sua vigência, serão aplicáveis previsões constitucionais a preservar o ato jurídico perfeito, a segurança jurídica e, por sua relevância, a autonomia da vontade e a liberdade de contratar.

Além disso, o entendimento que tem sido consolidado no Supremo Tribunal Federal (STF) ao longo dos anos é contrário à possibilidade da retroatividade da lei nova, assegurando a máxima efetividade da norma constitucional carreada pelo art. 5º, XXXVI, da CF, ressalvada a aplicação da chamada retroatividade mínima, em situações excepcionais, a permitir sejam temperadas para o futuro algumas relações jurídicas constituídas no passado. Desse modo, os contratos de planos de saúde firmados antes do advento da Lei 9.656/1998 podem ser considerados atos jurídicos perfeitos, e, como regra geral, estão blindados às mudanças supervenientes das regras vinculantes.

Ademais, nos termos do art. 35 da Lei 9.656/1998, assegurou-se, aos beneficiários dos contratos celebrados anteriormente ao início de sua vigência, a possibilidade de opção pelas novas regras, tendo o parágrafo 4° do mencionado dispositivo proibido que a migração fosse feita unilateralmente pela operadora.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 123 da repercussão geral, deu provimento a recurso extraordinário para julgar improcedente o pedido inicial.


A ausência do título de eleitor no momento da votação não constitui, por si só, óbice ao exercício do sufrágio.

O art. 91-A da Lei 9.504/1997, com a redação dada pela Lei 12.034/2009, e o art. 47, § 1º, da Resolução 23.218/2010 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com o objetivo de combater a fraude eleitoral, determinaram, para o exercício do sufrágio, a apresentação concomitante do título eleitoral e de documento oficial com foto.

Com o advento da biometria, no entanto, a discussão quanto à utilização de documentos de identificação diversos da biometria perdeu força, mas não foi de todo esvaziada. Há situações em que os eleitores serão identificados pelo modo tradicional, mediante apresentação de documento com foto: (a) eleitores ainda não cadastrados biometricamente; (b) inviabilização na utilização da biometria no dia da votação, por indisponibilidade momentânea ou ocasional do sistema ou impossibilidade de leitura das informações datiloscópicas do eleitor (impressão digital); ou (c) para o eleitorado geral, em situações excepcionais, como a que ocorre nas eleições municipais de 2020, ante o cenário deflagrado pela pandemia da Covid-19.

A análise da questão, sob o prisma do princípio da proporcionalidade, revela que o documento oficial com foto para identificação do eleitor é medida suficiente e adequada para garantir a autenticidade do voto, sendo desnecessária a exigência do título. Embora se reconheça que as reformas legislativas provocaram avanços significativos no sistema eleitoral, na hipótese vertente, o mecanismo imaginado para frear as investidas fraudulentas criou óbice desnecessário ao exercício do voto pelo eleitor. Isso porque, com a imposição da limitação, alguns eleitores, regularmente alistados, seriam alijados de participar do processo eleitoral caso não estivessem portando o título eleitoral no dia da votação, com eventuais reflexos na soberania popular e no próprio processo democrático.

Aplicável à hipótese, ademais, a “proibição do retrocesso”, uma vez que já conquistado pela sociedade o direito à autenticidade do voto, mediante a identificação do eleitor pela biometria, bem assim, de forma secundária, por documento com fotografia, a afastar qualquer entendimento segundo o qual a ausência do título eleitoral, no momento da votação, impede o exercício do voto.

Com base nesse entendimento, o Plenário confirmou medida cautelar e julgou procedente pedido formulado em ação direta para conferir interpretação conforme à Constituição aos arts. 91-A da Lei 9.504/1997 e 47, § 1º, da Resolução TSE 23.218/2010.

 

ADI 4467/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgamento virtual finalizado em 19.10.2020. (ADI-4467)


A entidade que não representa a totalidade de sua categoria profissional não possui legitimidade ativa para ajuizamento de ações de controle concentrado de constitucionalidade.

A Constituição Federal (CF) estabelece, em seu art. 103, o rol de legitimados para a propositura de ações de controle concentrado de constitucionalidade, dentre os quais estão as confederações sindicais e entidades de classe [CF, art. 103, IX (1)].

O Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento de que a legitimidade para o ajuizamento das ações de controle concentrado de constitucionalidade por parte de confederações sindicais e entidades de classe pressupõe: (a) a caracterização como entidade de classe ou sindical, decorrente da representação de categoria empresarial ou profissional; (b) a abrangência ampla desse vínculo de representação, exigindo-se que a entidade represente toda a respectiva categoria, e não apenas fração dela; (c) o caráter nacional da representatividade, aferida pela demonstração da presença da entidade em pelo menos 9 (nove) estados brasileiros; e (d) a pertinência temática entre as finalidades institucionais da entidade e o objeto da impugnação.

À vista disso, o Plenário, por maioria, conheceu do agravo regimental e negou-lhe provimento por entender que a entidade não representa toda a respectiva categoria profissional e, dessa forma, carece de legitimidade ativa para propositura da ação.


Não retroage a norma prevista no § 5º do art. 171 do Código Penal (CP) (1), incluída pela Lei 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”), que passou a exigir a representação da vítima como condição de procedibilidade para a instauração de ação penal, nas hipóteses em que o Ministério Público tiver oferecido a denúncia antes da entrada em vigor do novo diploma legal.

A norma processual anteriormente vigente definia a ação penal para o delito de estelionato, em regra, como pública incondicionada. Desse modo, nos casos em que já oferecida a denúncia, tem-se a concretização de ato jurídico perfeito, o que obstaculiza a interrupção da ação penal.

Por outro lado, por tratar-se de “condição de procedibilidade da ação penal”, a aplicação da regra prevista no § 5º do art. 171 do CP, com redação dada pela Lei 13.964/2019, será obrigatória em todas as hipóteses em que ainda não tiver sido oferecida a denúncia pelo Parquet, independentemente do momento da prática da infração penal, nos termos do art. 2º, do Código de Processo Penal (CPP) (2). Entendimento diverso demandaria expressa previsão legal, pois se estaria transformando a “representação da vítima”, clássica condição de procedibilidade, em verdadeira “condição de prosseguibilidade da ação penal”, alterando sua tradicional natureza jurídica. A representação da vítima somente estaria dispensada nas situações expressamente previstas no §5º do art. 171 do CP, uma vez que outros bens jurídicos estariam afetados.


DIREITO CONSTITUCIONAL E DIREITO CIVIL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. BUSCA E APREENSÃO DOS BENS. ART. 3º DO DECRETO-LEI 911/69. CONSTITUCIONALIDADE. Recurso Extraordinário a que se dá provimento para afastar a extinção de ofício do processo e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para o prosseguimento do julgamento do agravo de instrumento. Fixada a seguinte tese de julgamento: "O art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69 foi recepcionado pela Constituição Federal, sendo igualmente válidas as sucessivas alterações efetuadas no dispositivo”.

DIREITO CONSTITUCIONAL E DO TRABALHO. REPERCUSSÃO GERAL. CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL AUTÔNOMA, REGIDO PELA LEI nº 4.886/65. NÃO CONFIGURAÇÃO DE RELAÇÃO DE TRABALHO PREVISTA NO ART. 114, CF. 1. Recurso Extraordinário interposto contra decisão proferida pelo Tribunal Superior do Trabalho, em que se alega afronta ao art. 114, incisos I e IX, da Constituição Federal, com redação dada pela EC 45/2004. Na origem, cuida-se de ação de cobrança de comissões sobre vendas decorrentes de contrato de representação comercial autônoma, ajuizada pelo representante, pessoa física, em face do representado. 2. As atividades de representação comercial autônoma configuram contrato típico de natureza comercial, disciplinado pela Lei nº 4.886/65, a qual prevê (i) o exercício da representação por pessoa jurídica ou pessoa física, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para a realização de negócios mercantis e (ii) a competência da Justiça comum para o julgamento das controvérsias que surgirem entre representante e representado. 3. Na atividade de representação comercial autônoma, inexiste entre as partes vínculo de emprego ou relação de trabalho, mas relação comercial regida por legislação especial (Lei n° 4.886/65). Por conseguinte, a situação não foi afetada pelas alterações introduzidas pela EC n° 45/2004, que versa sobre hipótese distinta ao tratar da relação de trabalho no art. 114 da Constituição. 4. A proteção constitucional ao trabalho não impõe que toda e qualquer relação entre o contratante de um serviço e o seu prestador seja protegida por meio da relação de trabalho (CF/1988, art. 7º). Precedentes. 5. Ademais, os autos tratam de pedido de pagamento de comissões atrasadas. O pedido e a causa de pedir não têm natureza trabalhista, a reforçar a competência do Juízo Comum para o julgamento da demanda. 6. Recurso extraordinário a que se dá provimento, para assentar a competência da Justiça comum, com a fixação da seguinte tese: “Preenchidos os requisitos dispostos na Lei 4.886/65, compete à Justiça Comum o julgamento de processos envolvendo relação jurídica entre representante e representada comerciais, uma vez que não há relação de trabalho entre as partes”.

DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. CÁLCULO DO VALOR DO BENEFÍCIO DE COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA DEVIDA POR ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA FECHADA. CONTRATO QUE PREVÊ A APLICAÇÃO DE PERCENTUAIS DISTINTOS PARA HOMENS E MULHERES. QUEBRA DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. 1. A isonomia formal, assegurada pelo art. 5º, I, CRFB, exige tratamento equitativo entre homens e mulheres. Não impede, todavia, que sejam enunciados requisitos de idade e tempo de contribuição mais benéficos às mulheres, diante da necessidade de medidas de incentivo e de compensação não aplicáveis aos homens. 2. Incidência da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, com prevalência das regras de igualdade material aos contratos de previdência complementar travados com entidade fechada. 3. Revela-se inconstitucional, por violação ao princípio da isonomia (art. 5º, I, da Constituição da República), cláusula de contrato de previdência complementar que, ao prever regras distintas entre homens e mulheres para cálculo e concessão de complementação de aposentadoria, estabelece valor inferior do benefício para as mulheres, tendo em conta o seu menor tempo de contribuição. 5. Recurso extraordinário conhecido e desprovido.