Além disso, registrou que, em ações constitucionais de perfil objetivo, não se discutem situações individuais ou interesses subjetivos. Portanto, é inviável a concessão de tutela de índole ressarcitória requerida com o objetivo de reparar danos morais ou patrimoniais sofridos por terceiros. No processo de fiscalização abstrata em cujo âmbito se instauram relações processuais objetivas, a finalidade é uma só: a tutela objetiva da ordem constitucional, sem qualquer vinculação a situações jurídicas de caráter individual ou de natureza concreta.
A Primeira Turma iniciou a apreciação de mandado de segurança em que serventia judicial, com caráter privado, foi provida antes da Constituição Federal de 1988 (CF/1988).
O writ foi impetrado contra ato do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em procedimento de controle administrativo, por meio do qual foi: (a) declarada a estatização de serventias judiciais paranaenses indevidamente providas a partir de 5.10.1988; (b) fixado o prazo de doze meses para a efetivação das providências necessárias ao funcionamento delas; e (c) autorizada a permanência das pessoas, no exercício das atividades, nessas serventias, até o preenchimento dos cargos de acordo com cronograma aprovado ulteriormente pelo CNJ, a fim de evitar a descontinuidade dos serviços.
O ministro Marco Aurélio (relator) deferiu a ordem e afirmou que a situação não se confunde com a dos cartórios de notas e de registros. Relembrou que a Emenda Constitucional (EC) 7/1977 incluiu o art. 206 na Carta então em vigor, a revelar que “ficam oficializadas as serventias do foro judicial e extrajudicial, mediante remuneração de seus servidores exclusivamente pelos cofres públicos, ressalvada a situação dos atuais titulares, vitalícios ou nomeados em caráter efetivo”. Posteriormente, houve modificação não substancial desse mesmo artigo pela EC 22/1982.
Segundo o relator, na mudança do regime, o constituinte de 1988 constatou a quase ineficácia do disposto na EC 7/1977 e previu a estatização das serventias judiciais pelos estados brasileiros no art. 31 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) (1), com eficácia maior no campo prático, por meio de lei de organização judiciária ou diploma especial. No entanto, o CNJ não atentou para o hiato existente entre o formal e a realidade, tampouco para as repercussões, principalmente no campo jurisdicional. Da decisão atacada, resulta o desmantelamento da base da atuação judicial, que é a cartorária.
O ministro frisou que o ato do mencionado órgão apanhou situações consolidadas há muitos anos e, neste mandado de segurança, provimento pretérito à CF/1988, em que não se verificou a remoção do impetrante.
Dessa maneira, o CNJ substituiu o constituinte de 1988 e colocou em segundo plano o versado na parte final do art. 31 do ADCT, que sinalizou o respeito aos direitos dos atuais titulares decorrentes de situações constituídas em 1988, sem delimitação no tempo nem apego à unidade ano. Além de declarar a inconstitucionalidade do trecho final do dispositivo – obra do poder constituinte originário –, o Conselho substituiu-se ao estado do Paraná na estatização das serventias, suplantando os atos mais de cinco anos após a prática. No ponto, o ministro frisou que prescrição e decadência prestam homenagem a um predicado seriíssimo, a segurança jurídica.
Para o relator, o CNJ poderia ter acionado a Advocacia-Geral da União para tomar as medidas cabíveis, até mesmo no campo do processo objetivo, mas não baixar o decreto, que é praticamente lei, como havia no passado.
Em seguida, o julgamento foi suspenso com o pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.
o ministro Roberto Barroso explicitou que, havendo manifesta violação à CF, não se aplica o prazo decadencial de cinco anos previsto na Lei do Processo Administrativo (Lei 9.784/1999).
o ministro Alexandre de Moraes reportou-se à decisão na ADI 1.498, no sentido de que o art. 31 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) (1) é autoaplicável e que a CF/1988 estabeleceu a obrigatoriedade da estatização das serventias judiciais à medida que vagassem. Além disso, o ministro sublinhou que a origem dos cargos atualmente exercidos pelos impetrantes é posterior à CF/1988.
A seu ver, o estado do Paraná promoveu concursos de permuta e de remoção, para prolongar artificialmente o que foi estabelecido no dispositivo mencionado. Houve conflito entre o formal e o real, porque o real não quis se adequar ao que a Constituição determinou. Aliás, em vários estados-membros, chegou a ocorrer verdadeira fraude: criava-se nova serventia judicial, fazia-se a remoção e extinguia-se a anterior.
O ministro Edson Fachin (relator) negou provimento ao agravo regimental e manteve o entendimento proferido em sua decisão monocrática no sentido da não configuração da aderência estrita entre a decisão reclamada e o paradigma invocado. Segundo ele, não é possível extrapolar os limites do que decidido até agora em medida cautelar na ADPF, cuja extensão, se o Plenário assim entender, poderá ir além na apreciação do seu mérito. O relator foi acompanhado pela ministra Cármen Lúcia.
Na decisão monocrática, o ministro Fachin considerou que o Plenário, ao julgar a ADPF 347 MC, fixou a obrigatoriedade da audiência de custódia apenas para os casos de prisão em flagrante. Para ele, embora o Plenário tenha determinado “aos juízes e tribunais que, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, realizem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contados do momento da prisão”, não afirmou a necessidade dessa providência nos casos de prisão preventiva, temporária ou definitiva decretada por juízes ou tribunais.
Em divergência, o ministro Gilmar Mendes deu provimento ao recurso para julgar procedente a reclamação e determinar que o TJRJ realize a audiência de custódia em todas as hipóteses de prisões cautelares, até mesmo temporárias e preventivas.
Para o ministro Gilmar Mendes, o acórdão do Plenário não limitou a determinação da audiência de custódia exclusivamente aos casos de prisão em flagrante, mas indicou, de modo genérico, o comparecimento do preso à autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contado do momento da prisão.
Frisou que a ADPF 347 e as demais ações conexas envolvem diversos temas complexos relativos ao sistema penitenciário por vezes não decididos ou bem esclarecidos em uma única ação ou decisão. A complexidade e a variedade das questões discutidas e a necessidade de se resolverem essas novas demandas que surgem no transcorrer desses processos são características específicas das ações estruturais e do “estado de coisas inconstitucional” do sistema penitenciário brasileiro se comparados com o processo tradicional idealizado para resolução de uma disputa entre partes estabelecida em torno de um objeto bem definido.
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