Nesse sentido, o Relator, Conselheiro Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, observou nos
autos parecer da Corregedoria Nacional de Justiça que conclui ser a atividade extrajudicial um
serviço delegado do Poder Judiciário, bem como serem os delegatários investidos de estabilidade,
sujeitando-se a um regime estrito de direito público, e que também se sujeitam às regras de
transparência previstas na Constituição Federal, nas normas legais e nas normas do CNJ,
permitindo a alteração da Resolução CNJ nº 215/2015 para incluir notários e registradores de todo
o país.
O Conselheiro Mário Guerreiro, em voto-vista, propôs acréscimo às alterações sugeridas,
com a finalidade de adequá-las à LGPD, prevenindo-se potenciais conflitos entre a publicidade e a
proteção das informações dos cidadãos, o que foi acatado pelo Relator.
Ponderou que no atendimento ao princípio da publicidade não se pode descuidar para não
se exporem informações desnecessárias, que possam violar a proteção aos dados pessoais
disciplinada pela Lei 13.709/2018, bem como as medidas preconizadas pelo Conselho, através da
Resolução CNJ nº 363/2020, para adequação dos tribunais à LGPD.
Desse modo, acrescentou-se no artigo 8º, entre outros, a explicitação do dever de se velar
igualmente pela proteção dos direitos disciplinados pela Lei nº 13.709/2018.
Alterou-se também o §2º do art. 6º da Resolução que passará a ter a seguinte redação: as
informações individuais e nominais da remuneração de membro ou servidor mencionadas na alínea
“d” do inciso VII serão automaticamente disponibilizadas para divulgação ampla aos cidadãos e
controle dos órgãos competentes.
A mudança na Resolução CNJ nº 215/2015 prevê que as serventias extrajudiciais deverão
criar o campo transparência para dele constar, mensalmente: a) o valor obtido com emolumentos
arrecadados, outras receitas, inclusive eventual remuneração percebida pelo responsável pela
serventia; e b) o valor total das despesas.
Por fim, o Colegiado também aprovou incluir na Resolução CNJ nº 215/2015 que as
responsabilidades dos membros e servidores do Poder Judiciário e serviços auxiliares pelas
infrações descritas no Capítulo V da LAI e na LGPD serão devidamente apuradas de acordo com
os procedimentos administrativos regulamentados pelas leis aplicáveis
O PAD foi instaurado para apurar possível infração disciplinar do magistrado aos artigos
1º, 2º, 5º, 8º, 17, 25 e 37 do Código de Ética da Magistratura Nacional (CEMN) e ao artigo 35, inciso
I e VIII, da LOMAN, em razão da atuação do desembargador na concessão indevida de ordem em
habeas corpus e mandado de segurança, inclusive em plantões judiciários, mediante o recebimento
de vantagem indevida, bem como na celebração de acordos sabidamente ilegais para benefício
pessoal, caracterizadoras de corrupção passiva, concussão e peculato.
Nas razões finais, o magistrado alegou que é de rigor a suspensão do PAD até que seja
definitivamente julgada a Ação Penal pelo STJ, pois isso evitaria incoerências entre os
pronunciamentos definitivos nas esferas administrativa e penal. A preliminar foi afastada, pois
segundo o Relator, a Ação Penal encontra-se na fase final de inquirição das testemunhas e apesar
da efetiva caracterização do ilícito penal pressupor o esgotamento da via judicial própria, que ocorre
com o trânsito em julgado, a independência entre as instâncias autoriza o julgamento no âmbito do
CNJ.
O desembargador suscitou também a tese de nulidade das provas derivadas das
interceptações telefônicas produzidas na esfera penal sob os seguintes argumentos: i) o processo
administrativo não admite a interceptação telefônica como meio de prova, razão pela qual a prova
produzida em sede penal não poderia ser trasladada como prova emprestada; ii) as interceptações
telefônicas que deram base à acusação, no âmbito penal, estariam eivadas de nulidade.
O Relator rememorou que o entendimento dominante do STF é no sentido de que dados
obtidos em interceptações telefônicas realizadas com chancela judicial, no curso de investigação
criminal ou de instrução processual penal, podem ser utilizados como prova emprestada em
processo administrativo disciplinar. Além disso, justificou que não houve aproveitamento no PAD
em questão das provas provenientes das interceptações telefônicas realizadas no Inquérito da ação
penal. A única prova colhida por meio de interceptação telefônica, utilizada para embasar as
imputações formuladas em sede administrativa, foi autorizada por juízo de 1º grau.
O fato é que há registro nos autos de intensa comunicação entre advogados e familiares
do magistrado e diálogos interceptados entre traficantes, com posterior concessão da ordem em
habeas corpus, para colocar paciente em liberdade. Mensagens armazenadas em celular, entregue
à Policia Federal, demonstram que havia pretérita relação de troca de favores, além do costume de
fornecer cheques em branco como garantia de que as decisões seriam proferidas no sentido
acordado
O Conselho, por maioria, acolheu a alegação de prescrição e julgou extinto Procedimento
Administrativo Disciplinar (PAD) em razão do reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva
da Administração. O procedimento havia sido instaurado em desfavor de desembargadora com
afastamento cautelar das funções judicantes e administrativas para apurar eventual infração aos
artigos 35, inciso I, da Lei Orgânica da Magistratura - LOMAN e artigos 1º, 5º, 8º, 24 e 25 do Código
de Ética da Magistratura Nacional.
O PAD originou-se de Reclamação Disciplinar para averiguar indícios de declarações falsas
praticadas pela magistrada à Receita Federal do Brasil, com a inclusão de despesas não realizadas
nas Declarações de Ajuste Anual dos anos de 2006, 2007 e 2008, no suposto intuito de reduzir o
valor devido a título de IRPF, atraindo, assim, a possibilidade da incidência do crime de sonegação
fiscal previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90.
O voto inicialmente apresentado pela Relatora, Conselheira Flávia Pessoa, contemplava a
prorrogação do prazo de conclusão do processo, nos termos do artigo 14, §9º, da Resolução CNJ
nº 135/2011, bem assim proposta de revogação do afastamento cautelar da magistrada. No
entanto, considerando divergência iniciada pelo Conselheiro Emmanoel Pereira, confirmada no
voto do Conselheiro Luiz Fernando Tomasi Keppen, a Relatora entendeu pela imprescindibilidade
do reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva da Administração.
A ocorrência da prescrição já havia sido registrada nos autos pelo Ministério Público
Federal – MPF, que se manifestou pelo arquivamento do PAD, ressaltando o transcurso integral do
prazo prescricional, em relação à pena in abstrato.
Nos termos do artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, constitui crime contra a ordem tributária
suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante informação falsa
ou declaração falsa às autoridades fazendárias, com previsão de pena de reclusão de 2 (dois) a 5
(cinco) anos, e multa. Por sua vez, o Código Penal, em seu artigo 109, inciso III, prevê prazo
prescricional de 12 (doze) anos para os crimes cuja pena varia de 4 (quatro) a 8 (oito) anos,
englobando, o tipo penal da questão do PAD.
Observou-se ainda a circunstância de que a desembargadora completou a idade de 70
(setenta) anos, em maio de 2018. Nos termos do artigo 115 do CP são reduzidos à metade os
prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos,
ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos. Assim, ao tempo do julgamento
da Reclamação Disciplinar, em 18 de fevereiro de 2020, não se analisou que o prazo prescricional
alusivo ao crime seria de apenas 6 (seis) anos.
Destacou-se que também se impõe no âmbito administrativo a observância do mencionado
parâmetro, a fim de que se verifique a viabilidade da manutenção do PAD. Percebeu-se que,
independentemente dos fatos apurados, não seria mais possível atribuir qualquer penalidade
administrativa à magistrada, mesmo considerando-se a ocorrência do tipo penal invocado na
Portaria de deflagração do PAD (sonegação fiscal). O prazo prescricional em relação à pena, in
abstrato já estava exaurido antes mesmo da instauração do procedimento.
O Conselheiro Emmanoel Pereira pontuou que na esfera administrativa, a existência de
finalidade e objeto plausível é condição para o prosseguimento do processo, consoante artigo 52
da Lei nº 9.784/1999. O Conselheiro explicou que o prazo prescricional, em sede de procedimento
disciplinar, é computado, in abstrato, da data em que a autoridade responsável pela apuração de
eventual infração funcional toma conhecimento dos fatos, na forma do artigo 142, § 1º, da Lei nº
8.112/90. A deflagração do PAD é causa interruptiva da prescrição, de modo que a contagem do
prazo prescricional é reiniciada a contar do 141º (centésimo quadragésimo primeiro) dia posterior
à instauração do expediente, sendo que a partir de então, não se fala mais em penalidade, in
abstrato, mas no prazo prescricional da pena, in concreto, segundo o Conselheiro.
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