sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

RECURSO ESPECIAL Nº 1.809.204 - DF (2019/0116053-3)

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL

REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA REPETITIVO Nº 1023.

SERVIDOR PÚBLICO. PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO

RECORRIDO POR SUPOSTA OFENSA AOS ARTS. 10 E 487,

PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/2015. ANÁLISE. INVIABILIDADE.

PRECLUSÃO E AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS Nº

282 E 356 DO STF. VIOLAÇÃO AO ART. 1º DO DECRETO Nº 20.910/32.

PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS

MORAIS. AGENTE DE COMBATE A ENDEMIAS. ANGÚSTIA E

SOFRIMENTO DECORRENTES DA EXPOSIÇÃO DESPROTEGIDA E

SEM A DEVIDA ORIENTAÇÃO AO

DICLORO-DIFENIL-TRICLOROETANO – DDD. OMISSÃO DO ENTE

PÚBLICO. FUNDADO TEMOR DE PREJUÍZOS À SAÚDE DO AGENTE.

TERMO INICIAL. CIÊNCIA DOS MALEFÍCIOS QUE PODEM SURGIR DA

EXPOSIÇÃO DESPROTEGIDA À SUBSTÂNCIA QUÍMICA. TEORIA DA

ACTIO NATA. VIGÊNCIA DA LEI Nº 11.936/09. PROIBIÇÃO DO DDT EM

TODO TERRITÓRIO NACIONAL. IRRELEVÂNCIA PARA A DEFINIÇÃO

DO TERMO INICIAL. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE

CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO PARA DETERMINAR

NOVO JULGAMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO.

Preliminar de nulidade do acórdão recorrido

1. Quanto à preliminar de nulidade do acórdão recorrido, por suposta ofensa dos

arts. 10 e 487, parágrafo único, do CPC/2015, verifica-se que referida nulidade não

foi oportunamente alegada nos embargos de declaração opostos pelo recorrente

junto ao Tribunal de origem, os quais trataram apenas da prescrição. Vale dizer, o

recorrente não levantou a nulidade na primeira oportunidade após a ocorrência do

vício, restando configurada a preclusão da matéria, nos termos do art. 278 do

CPC/2015. Ademais, por não ter sido alegada perante a Corte Regional, a matéria

também não foi apreciada pelo Tribunal de origem, atraindo a incidência, por

analogia, das Súmulas nº 282 e 356 do STF.

Delimitação da controvérsia

2. O recorrente ajuizou a presente ação de indenização por danos morais em razão

de angústia e sofrimento decorrente de sua exposição prolongada a diversos

produtos químicos, dentre eles o dicloro-difenil-tricloroetano (DDT), utilizados no

desempenho das funções de agente de combate a endemias na extinta

Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (SUCAM) e, posteriormente, na

Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), sem o adequado treinamento para

manuseio e aplicação das substâncias, bem como sem o fornecimento de

equipamentos de proteção individual (EPI). Sustenta que possui fundado temor de

que referida exposição possa causar danos a sua saúde ou mesmo de sua família,

ante os malefícios provocados pelas substâncias químicas às quais esteve exposto,

especialmente o dicloro-difenil-tricloroetano (DDT).

3. A jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que o termo

inicial da prescrição para as ações de indenização por dano moral é o momento da

efetiva ciência do dano em toda sua extensão, em obediência ao princípio da actio

nata, uma vez que não se pode esperar que alguém ajuíze ação para reparação de

dano antes dele ter ciência.

4. O dano moral alegado, consistente no sofrimento e na angústia experimentados

pelo recorrente, apenas nasceu no momento em que o autor teve ciência inequívoca

dos malefícios que podem ser provocados por sua exposição desprotegida ao DDT.

5. A Lei nº 11.936/09 não traz qualquer justificativa para a proibição do uso do

DDT em todo o território nacional, e nem descreve eventuais malefícios causados

pela exposição à referida substância. Logo, não há como presumir, como

equivocadamente firmado pelo Tribunal de origem, que a partir da vigência da Lei

nº 11.936/09 os agentes de combate a endemias que foram expostos ao DDT

tiveram ciência inequívoca dos malefícios que poderiam ser causados pelo seu uso

ou manuseio.

Fixação da tese

6. Nas ações de indenização por danos morais, em razão de sofrimento ou angústia

experimentados pelos agentes de combate a endemias decorrentes da exposição

desprotegida e sem orientação ao dicloro-difenil-tricloroetano – DDT, o termo

inicial do prazo prescricional é o momento em que o servidor tem ciência dos

malefícios que podem surgir da exposição, não devendo ser adotado como marco

inicial a vigência da Lei nº 11.936/09, cujo texto não apresentou justificativa para a

proibição da substância e nem descreveu eventuais malefícios causados pela

exposição ao produto químico.

DO JULGAMENTO DO CASO CONCRETO

7. O Tribunal de origem reconheceu a prescrição da pretensão indenizatória,

aduzindo que o termo inicial do prazo prescricional para as ações em que se busca

indenização pela exposição ao DDT seria o dia 14/5/2009, data de início de

vigência da Lei nº 11.936/09, que proibiu o uso da substância em todo o território

nacional. Aduziu que, excepcionalmente, poderia ser fixada data posterior se

demonstrado, ab initio litis, que o autor obteve ciência inequívoca do fato causador

do dano em momento posterior à vigência de referida lei.

8. Nota-se que o entendimento do Tribunal Regional está em confronto com a tese

firmada no presente tema, devendo ser fixado como termo inicial o momento em

que o servidor, ora recorrente, teve ciência dos malefícios que podem surgir de sua

exposição desprotegida e sem orientação ao dicloro-difenil-tricloroetano – DDT,

sendo irrelevante a data de vigência da Lei nº 11.936/09.

9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido para

determinar a reapreciação do recurso de apelação, afastando-se a data de vigência

da Lei nº 11.936/09 como marco inicial do prazo prescricional


 

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