Regulamenta o inciso VII do § 1o do
art. 225 da Constituição Federal, estabelecendo procedimentos para o uso científico de animais;
revoga a Lei no 6.638, de 8 de maio de 1979; e dá
outras providências.
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O PRESIDENTE
DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono
a seguinte Lei:
CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1o A
criação e a utilização de animais em atividades de ensino e pesquisa
científica, em todo o território nacional, obedece aos critérios estabelecidos
nesta Lei.
§ 1o A
utilização de animais em atividades educacionais fica restrita a:
I – estabelecimentos de ensino superior;
II – estabelecimentos de educação profissional técnica de
nível médio da área biomédica.
§ 2o São
consideradas como atividades de pesquisa científica todas aquelas relacionadas
com ciência básica, ciência aplicada, desenvolvimento tecnológico, produção e
controle da qualidade de drogas, medicamentos, alimentos, imunobiológicos,
instrumentos, ou quaisquer outros testados em animais, conforme definido em
regulamento próprio.
§ 3o Não são consideradas como
atividades de pesquisa as práticas zootécnicas relacionadas à agropecuária.
Art. 2o O
disposto nesta Lei aplica-se aos animais das espécies classificadas como filo Chordata,
subfilo Vertebrata,
observada a legislação ambiental.
Art. 3o Para as
finalidades desta Lei entende-se por:
I – filo Chordata: animais que possuem, como
características exclusivas, ao menos na fase embrionária, a presença de notocorda, fendas
branquiais na faringe e tubo nervoso dorsal único;
II – subfilo Vertebrata: animais cordados
que têm, como características exclusivas, um encéfalo grande encerrado numa caixa craniana e uma
coluna vertebral;
III – experimentos: procedimentos
efetuados em animais vivos, visando à elucidação de fenônemos fisiológicos ou
patológicos, mediante técnicas específicas e preestabelecidas;
IV – morte por meios humanitários: a morte de um animal
em condições que envolvam, segundo as espécies, um mínimo de sofrimento físico
ou mental.
Parágrafo único. Não se considera experimento:
I – a profilaxia e o tratamento veterinário do animal que deles
necessite;
II – o anilhamento, a tatuagem, a marcação ou a aplicação de outro
método com finalidade de identificação do animal, desde que cause apenas dor ou
aflição momentânea ou dano passageiro;
III – as intervenções não-experimentais relacionadas às práticas
agropecuárias.
CAPÍTULO II
DO CONSELHO
NACIONAL DE CONTROLE DE
EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL – CONCEA
Art. 4o Fica
criado o Conselho Nacional
de Controle de Experimentação Animal – CONCEA.
Art. 5o Compete
ao CONCEA:
I – formular e zelar pelo cumprimento
das normas relativas à utilização
humanitária de animais com finalidade de ensino e pesquisa científica;
III – monitorar e avaliar a introdução
de técnicas alternativas
que substituam a utilização de animais em ensino e pesquisa;
IV – estabelecer e rever,
periodicamente, as normas para uso e cuidados com animais para ensino e
pesquisa, em consonância com as convenções internacionais das quais o Brasil
seja signatário;
V – estabelecer e rever, periodicamente,
normas técnicas para instalação e funcionamento de centros de criação, de biotérios e de
laboratórios de experimentação animal, bem como sobre as condições de trabalho
em tais instalações;
VI – estabelecer e rever,
periodicamente, normas para credenciamento de instituições que criem ou
utilizem animais para ensino e pesquisa;
VII – manter cadastro atualizado dos
procedimentos de ensino e pesquisa realizados ou em andamento no País, assim
como dos pesquisadores,
a partir de informações remetidas pelas Comissões de Ética no Uso de Animais - CEUAs, de que trata o
art. 8o desta Lei;
VIII – apreciar e decidir recursos interpostos contra decisões
das CEUAs;
IX – elaborar e submeter ao Ministro de Estado da Ciência e
Tecnologia, para aprovação, o seu regimento interno;
X – assessorar o Poder Executivo a
respeito das atividades de ensino e pesquisa tratadas nesta Lei.
Art.
6o O CONCEA é constituído por:
I
– Plenário;
II
– Câmaras Permanentes e Temporárias;
III
– Secretaria-Executiva.
§ 1o As Câmaras Permanentes e
Temporárias do CONCEA serão definidas no regimento interno.
§ 2o A Secretaria-Executiva é
responsável pelo expediente do CONCEA e terá o apoio administrativo do
Ministério da Ciência e Tecnologia.
§ 3o O CONCEA
poderá valer-se de consultores ad hoc de reconhecida
competência técnica e científica, para instruir quaisquer processos de sua
pauta de trabalhos.
Art. 7o O
CONCEA será presidido pelo Ministro
de Estado da Ciência e Tecnologia e integrado por:
I – 1 (um) representante de cada órgão e entidade a seguir
indicados:
a)
Ministério da Ciência e Tecnologia;
b)
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq;
c)
Ministério da Educação;
d)
Ministério do Meio Ambiente;
e)
Ministério da Saúde;
f)
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento;
g)
Conselho de Reitores das Universidades do Brasil – CRUB;
h)
Academia Brasileira de Ciências;
i)
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência;
j)
Federação das Sociedades de Biologia Experimental;
l)
Colégio Brasileiro de Experimentação Animal;
m)
Federação Nacional da Indústria Farmacêutica;
II – 2 (dois) representantes das sociedades protetoras de
animais legalmente estabelecidas no País.
§ 1o Nos seus
impedimentos, o Ministro
de Estado da Ciência e Tecnologia será substituído, na Presidência do CONCEA,
pelo Secretário-Executivo do respectivo Ministério.
§ 2o O Presidente do CONCEA terá o voto
de qualidade.
§ 3o Os membros do CONCEA não serão
remunerados, sendo os serviços por eles prestados considerados, para
todos os efeitos, de relevante serviço público.
CAPÍTULO III
DAS COMISSÕES DE
ÉTICA NO USO DE ANIMAIS – CEUAs
Art. 8o É
condição indispensável para o credenciamento das instituições com atividades de
ensino ou pesquisa com animais a constituição prévia de Comissões de Ética no Uso de Animais – CEUAs.
Art. 9o As
CEUAs são integradas por:
I – médicos veterinários e biólogos;
II – docentes e pesquisadores na área específica;
III – 1 (um) representante de sociedades protetoras de animais
legalmente estabelecidas no País, na forma do Regulamento.
Art. 10. Compete às CEUAs:
I – cumprir e fazer cumprir, no âmbito
de suas atribuições, o disposto nesta Lei e nas demais normas aplicáveis à
utilização de animais para ensino e pesquisa, especialmente nas resoluções do
CONCEA;
II – examinar previamente os
procedimentos de ensino e pesquisa a serem realizados na instituição à qual
esteja vinculada, para determinar sua compatibilidade com a legislação
aplicável;
III – manter cadastro atualizado dos
procedimentos de ensino e pesquisa realizados, ou em andamento, na instituição,
enviando cópia ao CONCEA;
IV – manter cadastro dos pesquisadores
que realizem procedimentos de ensino e pesquisa, enviando cópia ao CONCEA;
V – expedir, no âmbito de suas
atribuições, certificados que se fizerem necessários perante órgãos de
financiamento de pesquisa, periódicos científicos ou outros;
VI – notificar imediatamente ao CONCEA
e às autoridades sanitárias a ocorrência de qualquer acidente com os animais
nas instituições credenciadas, fornecendo informações que permitam ações
saneadoras.
§ 1o Constatado
qualquer procedimento em descumprimento às disposições desta Lei na execução de
atividade de ensino e pesquisa, a respectiva CEUA determinará a paralisação de
sua execução, até que a irregularidade seja sanada, sem prejuízo da aplicação
de outras sanções cabíveis.
§ 2o Quando se
configurar a hipótese prevista no § 1o deste artigo, a
omissão da CEUA acarretará sanções à instituição, nos termos dos arts. 17 e 20
desta Lei.
§ 3o Das decisões proferidas pelas CEUAs
cabe recurso, sem
efeito suspensivo, ao CONCEA.
§ 4o Os membros das CEUAs responderão
pelos prejuízos que, por dolo, causarem às pesquisas em andamento.
§ 5o Os membros das CEUAs estão
obrigados a resguardar o segredo industrial, sob pena de responsabilidade.
CAPÍTULO IV
DAS CONDIÇÕES DE CRIAÇÃO E USO DE ANIMAIS PARA ENSINO E
PESQUISA CIENTÍFICA
Art. 11. Compete ao Ministério da Ciência e
Tecnologia licenciar as atividades destinadas à criação de animais, ao ensino e à pesquisa científica
de que trata esta Lei.
Art. 12. A criação ou a
utilização de animais para pesquisa ficam restritas, exclusivamente, às instituições credenciadas no
CONCEA.
Art. 13. Qualquer instituição
legalmente estabelecida em território nacional que crie ou utilize animais para
ensino e pesquisa deverá requerer credenciamento no CONCEA, para uso de
animais, desde que,
previamente, crie a CEUA.
§ 1o A critério
da instituição e mediante autorização do CONCEA, é admitida a criação de mais de uma CEUA por
instituição.
§ 2o Na
hipótese prevista no § 1o deste artigo, cada CEUA
definirá os laboratórios
de experimentação animal, biotérios e centros de criação sob seu controle.
Art. 14. O animal só poderá ser
submetido às intervenções recomendadas nos protocolos dos experimentos que constituem a
pesquisa ou programa de aprendizado quando, antes, durante e após o
experimento, receber cuidados especiais, conforme estabelecido pelo CONCEA.
§ 1o O animal
será submetido a eutanásia, sob estrita obediência às prescrições pertinentes a
cada espécie, conforme as diretrizes do Ministério da Ciência e Tecnologia, sempre que,
encerrado o experimento ou em qualquer de suas fases, for tecnicamente
recomendado aquele procedimento ou quando ocorrer intenso sofrimento.
§ 2o
Excepcionalmente, quando
os animais utilizados em experiências ou demonstrações não forem submetidos a
eutanásia, poderão
sair do biotério após a intervenção, ouvida a respectiva CEUA quanto aos critérios vigentes
de segurança, desde que
destinados a pessoas idôneas ou entidades protetoras de animais devidamente legalizadas,
que por eles queiram
responsabilizar-se.
§ 3o Sempre que possível, as práticas
de ensino deverão ser fotografadas, filmadas ou gravadas, de forma a permitir sua reprodução para
ilustração de práticas futuras, evitando-se a repetição desnecessária de procedimentos
didáticos com animais.
§ 4o O número de animais a serem
utilizados para a execução de um projeto e o tempo de duração de cada experimento
será o mínimo
indispensável para produzir o resultado conclusivo, poupando-se, ao
máximo, o animal de sofrimento.
§ 5o Experimentos que possam causar
dor ou angústia desenvolver-se-ão sob sedação, analgesia ou anestesia
adequadas.
§ 6o Experimentos cujo objetivo seja
o estudo dos processos relacionados à dor e à angústia exigem autorização
específica da CEUA, em
obediência a normas estabelecidas pelo CONCEA.
§ 7o É vedado o uso de bloqueadores
neuromusculares ou de relaxantes musculares em substituição a substâncias
sedativas, analgésicas ou anestésicas.
§
8o É vedada a reutilização do mesmo animal depois de
alcançado o objetivo principal do projeto de pesquisa.
§ 9o Em
programa de ensino, sempre
que forem empregados procedimentos traumáticos, vários procedimentos poderão
ser realizados num mesmo animal, desde que todos sejam executados durante a vigência de um único
anestésico e que o
animal seja sacrificado antes de recobrar a consciência.
§ 10. Para a realização de
trabalhos de criação e experimentação de animais em sistemas fechados, serão consideradas as
condições e normas de segurança recomendadas pelos organismos internacionais
aos quais o Brasil se vincula.
Art. 15. O CONCEA, levando em
conta a relação entre o nível de sofrimento para o animal e os resultados
práticos que se esperam obter, poderá restringir ou proibir experimentos que
importem em elevado grau de agressão.
Art. 16. Todo projeto de pesquisa
científica ou atividade de ensino será supervisionado por profissional de nível
superior, graduado ou pós-graduado na área biomédica, vinculado a entidade de
ensino ou pesquisa credenciada pelo CONCEA.
CAPÍTULO V
DAS PENALIDADES
Art. 17. As instituições que
executem atividades reguladas por esta Lei estão sujeitas, em caso de
transgressão às suas disposições e ao seu regulamento, às penalidades
administrativas de:
I – advertência;
II – multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 20.000,00 (vinte
mil reais);
III – interdição temporária;
IV – suspensão de financiamentos provenientes de fontes
oficiais de crédito e fomento científico;
V – interdição definitiva.
Parágrafo único. A interdição por
prazo superior a 30
(trinta) dias somente
poderá ser determinada em ato do Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia,
ouvido o CONCEA.
Art. 18. Qualquer pessoa que execute de forma
indevida atividades reguladas por esta Lei ou participe de procedimentos não
autorizados pelo CONCEA será passível das seguintes penalidades
administrativas:
I – advertência;
II – multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 5.000,00 (cinco
mil reais);
III – suspensão temporária;
IV – interdição definitiva para o
exercício da atividade regulada nesta Lei.
Art. 19. As penalidades previstas
nos arts. 17 e 18 desta Lei serão aplicadas de acordo com a gravidade da
infração, os danos que dela provierem, as circunstâncias agravantes ou
atenuantes e os antecedentes do infrator.
Art. 20. As sanções previstas nos
arts. 17 e 18 desta Lei serão aplicadas pelo CONCEA, sem prejuízo de
correspondente responsabilidade penal.
Art. 21. A fiscalização das
atividades reguladas por esta Lei fica a cargo dos órgãos dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento, da Saúde, da Educação, da Ciência e Tecnologia e do Meio
Ambiente, nas respectivas áreas de competência.
CAPÍTULO VI
DISPOSIÇÕES GERAIS E TRANSITÓRIAS
Art. 22. As instituições que
criem ou utilizem animais para ensino ou pesquisa existentes no País antes da
data de vigência desta Lei deverão:
I – criar a CEUA, no prazo máximo de 90 (noventa) dias,
após a regulamentação referida no art. 25 desta Lei;
II – compatibilizar suas instalações
físicas, no prazo máximo
de 5 (cinco) anos, a partir da entrada em vigor das normas estabelecidas
pelo CONCEA, com base no inciso V do caput do art. 5o desta
Lei.
Art. 23. O CONCEA, mediante
resolução, recomendará às agências de amparo e fomento à pesquisa científica o
indeferimento de projetos por qualquer dos seguintes motivos:
I – que estejam sendo realizados sem a
aprovação da CEUA;
II – cuja realização tenha sido
suspensa pela CEUA.
Art. 24. Os recursos
orçamentários necessários ao funcionamento do CONCEA serão previstos nas
dotações do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Art. 25. Esta Lei será
regulamentada no prazo de 180 (cento e oitenta) dias.
Art. 26. Esta Lei entra em vigor
na data de sua publicação.
Brasília, 8 de
outubro de 2008; 187o da Independência e 120o da
República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Tarso Genro
Reinhold Stephanes
José Gomes Temporão
Miguel Jorge
Luiz Antonio Rodrigues Elias
Carlos Minc
Tarso Genro
Reinhold Stephanes
José Gomes Temporão
Miguel Jorge
Luiz Antonio Rodrigues Elias
Carlos Minc
Este texto não substitui o publicado no
DOU de 9.10.2008
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