terça-feira, 25 de janeiro de 2022

Informativo 719-STJ (Dizer o Direito)

 Caso concreto: em 2012, após processo seletivo, João foi contratado como servidor temporário

(art. 37, IX, da CF/88) para prestar serviços como inspetor penitenciário. Em 2014, foi

exonerado por “conveniência administrativa”, não tendo recebido, contudo, qualquer punição

durante o tempo em que exerceu suas funções. Em 2019, o Estado instaurou processo seletivo

simplificado para novamente contratar servidores temporários para exercerem as funções de

inspetor penitenciário. João se inscreveu e foi aprovado. A despeito disso, não pode ser

contratado por conta da vedação constante no item 11.8 do edital, que dizia o seguinte: “11.8.

O candidato que houver sido contratado ou nomeado anteriormente pela SEJUS e que tiver

sido exonerado, ou tiver tido o contrato rescindido por conveniência administrativa e/ou ato

motivado pela Corregedoria e/ou por determinação judicial, será automaticamente eliminado

do processo seletivo.”

Impedir que o candidato participe do processo seletivo simplificado porque, há alguns anos,

seu contrato foi rescindido por conveniência administrativa, equivale a impedir, hoje, a sua

participação na seleção por mera conveniência administrativa, o que viola o princípio da

isonomia e da impessoalidade.

STJ. 2ª Turma. RMS 67.040-ES, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 23/11/2021 (Info 719).


Não é possível impor a provedores de aplicações de pesquisa na internet o ônus de instalar

filtros ou criar mecanismos para eliminar de seu sistema a exibição de resultados de links

contendo o documento supostamente ofensivo.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.593.249-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 23/11/2021 (Info 719).


Provedor de e-mail não é obrigado a guardar e-mails que foram deletados

Não há previsão legal atribuindo aos provedores de aplicações que oferecem serviços de email o dever de armazenar as mensagens recebidas ou enviadas pelo usuário e que foram

deletadas.

O Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) não impõe esse dever aos provedores de email.

Provedor de e-mail não pode ser responsabilizado pelo fato de um hacker, ao conseguir acessar

a conta de e-mail do usuário, ter subtraído as criptomoedas que ele possuía

O provedor de aplicações que oferece serviços de e-mail não pode ser responsabilizado pelos

danos materiais decorrentes da transferência de bitcoins realizada por hacker.

O usuário teve a sua conta de e-mail invadida por um hacker, que também acessou a sua

carteira de bitcoins e transferiu as criptomoedas para a conta de outro usuário. Não se pode

atribuir ao Gmail a responsabilidade por tais danos materiais porque, ainda que a

gerenciadora adote o sistema de dupla autenticação, qual seja, digitação da senha e envio, via

e-mail, do link de acesso, a simples entrada neste é insuficiente para propiciar o ingresso na

carteira virtual e, consequentemente, a transação das criptomoedas. Logo, a ausência de nexo

causal entre o dano e a conduta do Gmail obsta a atribuição a esta da responsabilidade pelo

prejuízo material experimentado pelo usuário.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.885.201-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/11/2021 (Info 719).


Exemplo hipotético: em 2015, Lúcia adquiriu um aparamento financiado em 60 prestações

mensais; nessa época, Lúcia namorava Henrique. Lúcia arcou, de forma autônoma e

independente, com os valores para a aquisição do imóvel, sem qualquer ajuda financeira por

parte de Henrique. Em 2018, Lúcia e Henrique se casaram, sob o regime da comunhão parcial

de bens. Em 2020, Lúcia terminou de pagar o financiamento do apartamento. Em 2021, Lúcia

e Henrique se divorciaram.

A mulher arcou de forma autônoma e independente com os valores para a aquisição do bem,

motivo pelo qual o pagamento de financiamento remanescente não repercute em posterior

partilha por ocasião do divórcio, sendo considerado montante estranho à comunhão de bens.

O ex-cônjuge não faz jus a nenhum benefício patrimonial decorrente do negócio jurídico, sob

pena de a circunstância configurar um manifesto enriquecimento sem causa.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.841.128-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 23/11/2021 (Info 719)


Henrique pediu inicialmente para ter direito à metade do apartamento. Esse pedido deve ser acolhido?

NÃO.

O apartamento foi adquirido antes do casamento, de forma que atrai a regra do art. 1.661 do Código Civil:

Art. 1.661. São incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao

casamento.

Subsidiariamente, Henrique pediu para ter direito a uma parte do apartamento, considerando que

diversas parcelas foram pagas durante o período em que eles já estavam casados. Logo, presume-se que

tais parcelas foram pagas com o esforço comum.

Esse pedido subsidiário pode ser aceito? Ele deve ter direito a alguma parte do apartamento?

Também NÃO.

Também não se pode incluir na partilha as parcelas remanescentes do financiamento e que foram pagas

durante o casamento.

A mulher arcou de forma autônoma e independente com os valores para a aquisição do bem, motivo pelo

qual o pagamento de financiamento remanescente não repercute em posterior partilha por ocasião do

divórcio, sendo considerado montante estranho à comunhão de bens.

Desse modo, o ex-cônjuge não faz jus a nenhum benefício patrimonial decorrente do negócio jurídico, sob

pena de a circunstância configurar um manifesto enriquecimento sem causa.

Em suma:

Não se comunicam, na partilha decorrente de divórcio, os bens adquiridos por uma das partes antes do

casamento, no período de namoro.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.841.128-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 23/11/2021 (Info 719)


É cabível o pedido de habilitação de crédito da Fazenda Pública na falência desde que suspensa

a execução fiscal.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.872.153-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 09/11/2021 (Info 719)


É possível a execução provisória da multa cominatória fixada em tutela provisória de

urgência?

CPC/1973: a multa cominatória fixada em antecipação de tutela somente podia ser objeto de

execução provisória

• após a sua confirmação pela sentença de mérito e;

• desde que o recurso eventualmente interposto não fosse recebido com efeito suspensivo.

STJ REsp 1.200.856-RS, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 1º/7/2014 (Tema 743).

CPC/2015: Art. 537 (...) § 3º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório,

devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em

julgado da sentença favorável à parte.

Desse modo, à luz do CPC/2015, não se aplica a tese firmada no julgamento do REsp

1.200.856/RS, considerando que o novo CPC inovou na matéria, permitindo a execução

provisória da multa cominatória mesmo antes da prolação de sentença de mérito.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.958.679-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/11/2021 (Info 719)


O réu foi absolvido pela Justiça Eleitoral. Ocorre que, logo em seguida, foi denunciado, pelos

mesmos fatos, na Justiça Estadual. Isso não é possível.

A sentença da Justiça Eleitoral foi proferida no exercício de verdadeira jurisdição criminal, de

modo que o prosseguimento da ação penal na Justiça Estadual pelos mesmos fatos encontra

óbice no princípio da vedação à dupla incriminação, também conhecido como double jeopardy

clause ou, como é mais comum no direito brasileiro, o postulado do ne bis in idem (proibição

da dupla persecução penal).

Embora não tenha previsão expressa na Constituição Federal de 1988, a garantia do ne bis in

idem é um limite implícito ao poder estatal, derivada da própria coisa julgada e decorrente de

compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. A Convenção Americana de Direitos

Humanos e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, incorporados ao direito

brasileiro com status supralegal, tratam da vedação à dupla incriminação.

STJ. 5ª Turma. REsp 1.847.488-SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 20/04/2021 (Info 719)


Considerado o rigor formal do procedimento do júri, não é possível que o juiz,

unilateralmente, estabeleça prazos diversos daqueles definidos pelo legislador (art. 477 do

CPP) para os debates orais, seja para mais ou para menos, sob pena de chancelar uma decisão

contra legem.

Por outro lado, é possível que, no início da sessão de julgamento, mediante acordo entre as

partes, seja estabelecida uma divisão de tempo que melhor se ajuste às peculiaridades do caso

concreto.

STJ. 6ª Turma. HC 703.912-RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 23/11/2021 (Info 719)



Os jurados não precisam motivar sua decisão (sistema da íntima convicção), no entanto, o

Tribunal de 2ª instância precisa fazê-lo. Por isso, ao julgar a apelação da defesa, cabe ao

Tribunal de Justiça (ou TRF) a tarefa de identificar quais foram as provas produzidas nos autos

que demonstram a autoridade e a materialidade delitivas, bem como eventuais qualificadoras,

sob pena de, não o fazendo, incorrer em negativa de prestação jurisdicional.

Se o Tribunal encontrar prova judicializada idônea, deverá manter a condenação e/ou a

qualificadora.

Por outro lado, se não houver provas produzidas na forma do art. 155 do CPP, o Tribunal

deverá dar provimento ao recurso, cassando a condenação.

Caso concreto: as qualificadoras foram baseadas apenas no depoimento prestado no inquérito

policial por uma testemunha que ouviu dizer. Diante disso, o STJ decidiu cassar a sentença e

submeter o réu a novo júri. Isso porque:

As qualificadoras de homicídio fundadas exclusivamente em depoimento indireto (Hearsay

Testimony), violam o art. 155 do CPP, que deve ser aplicado aos veredictos condenatórios do

Tribunal do Júri.

STJ. 5ª Turma. REsp 1.916.733-MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 23/11/2021 (Info 719)


Exemplo: “M” é uma empresa brasileira, localizada em Santos (SP), que tem por atividade

principal a prestação de serviços de reparo e manutenção de navios e outras embarcações.

Vale ressaltar que a empresa detém tecnologia para fazer os consertos nas embarcações sem

que elas precisem atracar. Assim, os serviços podem ser realizados em alto mar. “M” foi

contratada para fazer reparos em um navio de bandeira estrangeira, que estava em águas

marítimas do Brasil. O serviço foi executado e a empresa paga por isso. “M” deverá pagar ISSQN

sobre esse serviço realizado.

No caso, os serviços são prestados em território nacional porque as embarcações estrangeiras

se encontram em águas marítimas brasileiras. Não se pode falar que seja no exterior. Nesse

sentido:

LC 116/2003: Art. 3º (...) § 3º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no local do

estabelecimento prestador nos serviços executados em águas marítimas, excetuados os

serviços descritos no subitem 20.01.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.805.226-SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 09/11/2021 (Info 719).


O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa

jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, não pode ser autorizado contra o sócio

ou o terceiro não sócio que, embora exercessem poderes de gerência ao tempo do fato gerador,

sem incorrer em prática de atos com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social

ou aos estatutos, dela regularmente se retirou e não deu causa à sua posterior dissolução

irregular, conforme art. 135, III do CTN.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.377.019-SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 24/11/2021 (Recurso

Repetitivo - Tema 962) (Info 719).


O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente

nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido

através do Nível de Exposição Normalizado (NEN).

Ausente tal informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de

ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da

exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.886.795-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 18/11/2021 (Recurso

Repetitivo - Tema 1083) (Info 719).


É inviável a expulsão de estrangeiro visitante ou migrante do território nacional quando

comprovado tratar-se de pai de criança brasileira que se encontre sob sua dependência

socioafetiva.

Vale ressaltar que, no caso concreto, a única prova trazida aos autos foi uma declaração

fornecida pela genitora da criança, na qual ela afirma que o paciente, em vias de ser expulso

do Brasil, sempre assistiu, afetiva e materialmente, o infante.

STJ. 1ª Seção. HC 666.247-DF, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 10/11/2021 (Info 719)



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