Extinção de conselhos
por decreto
O Plenário, por maioria, deferiu
parcialmente medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade para
suspender a eficácia do § 2º do art. 1º do Decreto 9.759/2019 (1), na redação
dada pelo Decreto 9.812/2019, e para afastar, até o exame definitivo dessa
ação, a possibilidade de ter-se a extinção, por ato unilateralmente editado
pelo chefe do Executivo, de colegiado cuja existência encontre menção em lei em
sentido formal, ainda que ausente expressa referência "sobre a competência
ou a composição". Além disso, por arrastamento, suspendeu a eficácia de
atos normativos posteriores a promoverem, na forma do art. 9º do Decreto
9.759/2019 (2), a extinção dos órgãos.
O Tribunal afirmou que o ato
questionado prevê a extinção, a ser implementada em 28 de junho de 2019, dos
órgãos colegiados da Administração Federal instituídos mediante a edição de
decretos e atos de hierarquia normativa inferior – “incluídos aqueles
mencionados em leis nas quais não conste a indicação de suas competências ou
dos membros que o compõem” –, exceto aqueles previstos em regimentos internos
ou estatutos de instituições federais de ensino e aqueles criados ou alterados
por ato publicado a partir de 1º de janeiro de 2019.
O ato normativo em questão prevê,
ainda, que órgãos e entidades da Administração Federal Direta, Autárquica e
Fundacional encaminhem à Casa Civil da Presidência da República, até 28 de maio
de 2019, relação dos colegiados que presidam, coordenem ou de que participem,
bem como determina a publicação, até 1º de agosto de 2019, dos atos
revogatórios das normas instituidoras dos colegiados extintos.
Com a edição do Decreto,
instituíram-se requisitos a serem observados visando à criação, recriação ou
mesmo ampliação dos existentes, mediante decreto ou portaria interministerial.
Com fundamento no disposto no art.
84, caput e inciso VI, alínea a, da Constituição Federal (CF) (3), o decreto
questionado encerra normas dotadas de generalidade e abstração, circunstância
reveladora de caráter primário e autônomo a justificar o exame, em abstrato, da
higidez constitucional do ato com base exclusivamente na Constituição Federal.
A Emenda Constitucional 32/2001, que
alterou a redação do inciso VI do art. 84, reintroduziu, na ordem
constitucional, a figura jurídica do decreto autônomo, espécie normativa
distinta daquele de natureza regulamentadora, descrito no inciso VI, voltado à
fiel execução da lei em sentido formal. Franqueou-se ao chefe do Executivo a
possibilidade de dispor sobre a estruturação da Administração Federal –
ressalvada a instituição de medidas que impliquem aumento de despesa, criação e
extinção de órgãos públicos –, instituindo-se, no ponto, verdadeira hipótese de
reserva legal, na forma do inciso XI do art. 48 (4) da CF.
Surge
intuitiva a necessidade de perquirir se os colegiados citados nos incisos do
art. 2º do Decreto questionado – a saber, conselhos, comitês, comissões,
grupos, juntas, equipes, mesas, fóruns e salas – devem ser considerados órgãos
públicos para o fim de enquadramento nas previsões contidas nos mencionados
preceitos constitucionais.
A resposta
não é autoevidente, considerada a amplitude semântica do vocábulo “órgão”,
instituto derivado do fenômeno de desconcentração administrativa, por meio do
qual é promovida a especialização de funções no âmbito da estrutura estatal,
sem a criação de novas pessoas jurídicas.
Ausente solução definitiva e a salvo
de dúvida razoável quanto à natureza dos colegiados em jogo, a indeterminação
semântica do disposto na Constituição Federal exige a análise da melhor opção
interpretativa sob o ângulo conceitual, observados o princípio da separação de Poderes
e a necessidade de reconhecer espaço legítimo de interpretação constitucional
aos demais agentes políticos de cúpula do Estado.
Sob essa perspectiva, é desnecessário
examinar se os colegiados mencionados nos incisos do art. 2º do Decreto
9.759/2019 revelam-se “órgãos públicos” com vistas ao enquadramento no que
disposto nos arts. 48, XI, e 84, VI, da CF. A questão resolve-se, isso sim, a
partir da verificação de atuação anterior do Parlamento no sentido de promover,
sob o influxo dos ares democráticos da Carta de 1988, a atuação dos diversos
grupos representativos da sociedade civil organizada na tomada de decisões
importantes da vida nacional, ante a previsão, em lei, da existência de
determinado colegiado, mostrando-se irrelevante o veículo normativo mediante o
qual efetivamente implementado.
Isso porque, por instrumentos de
democracia participativa, compreende-se mais do que a corriqueira referência
aos projetos de lei de iniciativa popular e aos institutos do referendo e do
plebiscito. Traduzem-se em toda e qualquer forma legal de controle, pela
sociedade, dos atos da Administração, considerada a influência da atuação
popular na formulação das decisões políticas e na gestão da coisa pública,
fornecendo-lhes a necessária legitimidade democrática.
Ao consagrar, junto aos mecanismos representativos,
o princípio de participação direta na gestão pública, o texto constitucional,
no que dotado de inequívoca força normativa, promoveu a emergência de diversos
institutos alusivos à gestão ou à fiscalização de políticas públicas.
A conclusão
constitucionalmente mais adequada, em sede precária e efêmera, consiste em
suspender, até o exame definitivo da controvérsia, a extinção, por ato
unilateralmente editado pelo chefe do Executivo, de órgão colegiado que,
contando com assento legal, viabilize a participação popular na condução das
políticas públicas – mesmo quando ausente expressa “indicação de suas
competências ou dos membros que o compõem”.
O
Parlamento é a arena preferencial de deliberação no âmbito da democracia
representativa, de modo que, ao prever, em sede legal, a existência de
determinado colegiado como mecanismo de participação direta da sociedade civil
na gestão da coisa pública, acaba por fornecer, mediante a institucionalização
de espaços de participação social, concretude ao que se poderia denominar
“espírito de 1988” – a ser levado em conta, linear e indistintamente, por todos
os Poderes da República.
Ao fazê-lo,
as Casas Legislativas partilharam, em alguma medida, de prerrogativa que lhes é
própria: discutir, em sede deliberativa, fiscalizatória e legiferante, as
grandes questões nacionais e as diretrizes de atuação do Estado na condução de
políticas públicas. Observada a organicidade da ordem constitucional, é
razoável condicionar a extinção de determinado órgão colegiado com assento
legal à prévia chancela parlamentar.
Interpretação
em sentido diverso esvaziaria importante espaço institucional de diálogo entre
os Poderes, o que não se confunde com eventual tentativa de manietar o
Executivo com a supressão ou limitação das atribuições essenciais do chefe do
Poder no desempenho da função de gestor superior da Administração.
É nítida a
tentativa, empreendida pelo chefe do Executivo, de escantear o Legislativo de
tal processo, uma vez que, conforme previsto no art. 7º e reforçado pela
Advocacia-Geral da União em manifestação juntada ao processo, competirá ao
Executivo, mediante a atuação das “Pastas ministeriais”, “decidir sobre os
colegiados a serem mantidos”.
Sob o ângulo do perigo da demora, mostra-se
presente o requisito para a concessão da medida acauteladora, ante a extinção
de órgãos colegiados alcançados pela aplicação do preceito impugnado, não
obstante definidos em lei – o que, em parte, já se deu com a edição do Decreto
9.784/2019, por meio do qual foi declarada a revogação de cerca de 50 conselhos
da Administração Federal, em observância ao disposto no art. 9º do Decreto
9.759/2019 (4).
A louvável preocupação com a
racionalização do funcionamento da máquina pública e a economia de recursos
públicos, traduzida na redação dos incisos do art. 6º do Decreto 9.759/2019 e
citada na exposição de motivos subscritas pelo titular da Casa Civil da
Presidência, não legitima atalhos à margem do figurino legal.
Não conduz
à conclusão contrária o fato de parte dos órgãos colegiados da
Administração Federal encontrarem-se, na prática, inativos, havendo inclusive a
revogação das leis que lhe justificam a existência. Descabe fulminá-los de
cambulhada, sob pena de apanhar-se órgãos em pleno e efetivo funcionamento.
Assentada a
necessidade de ter-se suspensos os efeitos do preceito impugnado, cumpre
reconhecer, por decorrência lógica, a impossibilidade de manter-se hígidos os
atos normativos posteriores que, com fundamento no art. 9º do Decreto
9.759/2019, promovam o efetivo afastamento desses órgãos do cenário normativo.
Vencidos os ministros Edson Fachin,
Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Celso de Mello, que concederam
integralmente a cautelar por considerarem haver, além da inconstitucionalidade
formal, vício de inconstitucionalidade material.
(1) Decreto 9.759/2019: “Art. 1º Este
Decreto extingue e estabelece diretrizes, regras e limitações para colegiados
da administração pública federal direta, autárquica e fundacional § 1º A
aplicação deste Decreto abrange os colegiados instituídos por: (incluído pelo
Decreto nº 9.812/2019) I – decreto; (incluído pelo Decreto nº 9.812/2019) II –
ato normativo inferior a decreto; e (incluído pelo Decreto nº 9.812/2019) III –
ato de outro colegiado. (incluído pelo Decreto nº 9.812/2019) § 2º Aplica-se o
disposto no § 1º aos colegiados instituídos por ato infralegal, cuja lei em que
são mencionados nada conste sobre a competência ou a composição. (incluído pelo
Decreto nº 9.812/2019)”
(2) Decreto 9.759/2019: “Art. 9º Até
1º de agosto de 2019, serão publicados os atos, ou, conforme o caso,
encaminhadas à Casa Civil da Presidência da República as propostas de revogação
expressa das normas referentes aos colegiados extintos em decorrência do
disposto neste Decreto.”
(3) CF/1988: “ Art. 84. Compete
privativamente ao Presidente da República: (...) VI – dispor, mediante decreto,
sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não
implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos;”
(4) CF/1988: “Art. 48. Cabe ao
Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta
para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de
competência da União, especialmente sobre:
(...) XI – criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração
pública;”
DIREITO
CONSTITUCIONAL – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO
Homofobia e
omissão legislativa – 4
Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria,
julgou procedentes os pedidos formulados em ação direta de
inconstitucionalidade por omissão (ADO) e em mandado de injunção (MI) para
reconhecer a mora do Congresso Nacional em editar lei que criminalize os atos
de homofobia e transfobia. Determinou, também, até que seja colmatada essa
lacuna legislativa, a aplicação da Lei 7.716/1989 (que define os crimes
resultantes de preconceito de raça ou de cor) às condutas de discriminação por
orientação sexual ou identidade de gênero, com efeitos prospectivos e mediante
subsunção.
Prevaleceram os votos dos ministros Celso de Mello e
Edson Fachin, relatores da ADO e do MI, respectivamente (Informativo 931). A
corrente majoritária reconheceu, em suma, que a omissão do Congresso Nacional
atenta contra a Constituição Federal (CF), a qual impõe, nos termos do seu art.
5º, XLI e XLII (1), inquestionável mandado de incriminação. Entendeu que as
práticas homotransfóbicas se qualificam como espécies do gênero racismo, na
dimensão de racismo social consagrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no
julgamento do HC 82.424/RS (caso
Ellwanger). Isso porque essas condutas importam em atos de segregação que
inferiorizam os integrantes do grupo de Lésbicas, Gays, Bissexuais e
Transexuais (LGBT), em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de
gênero. Considerou, ademais, que referidos comportamentos se ajustam ao
conceito de atos de discriminação e de ofensa aos direitos e liberdades
fundamentais dessas pessoas.
Na ADO, o colegiado, por maioria, fixou a seguinte
tese: “1. Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a
implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do
art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas,
reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade
de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em
sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação
típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de
08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso,
circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art.
121, § 2º, I, “in fine”); 2. A repressão penal à prática da homotransfobia não
alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer
que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros
(sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou
celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito
de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer
outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que
se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo
sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar
prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente
do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que
tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas
exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência
contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de
gênero; 3. O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se
para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta,
enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural
motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle
ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da
alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo
vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de
hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e
diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico,
expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa
estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de
proteção do direito”.
Ficaram vencidos, em ambas as ações, os ministros
Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Marco Aurélio.
Os dois primeiros conheceram em parte das ações e as
julgaram parcialmente procedentes apenas para reconhecer a mora legislativa e
dar ciência ao Congresso Nacional para a adoção das providências necessárias.
Para eles, não obstante a repugnância que provocam as condutas preconceituosas
de qualquer tipo, somente o Poder Legislativo pode criminalizar condutas, sendo
imprescindível lei em sentido formal. Portanto, a extensão do tipo penal para
abarcar situações não especificamente tipificadas pela norma penal
incriminadora atenta contra o princípio da reserva legal (2).
O ministro Marco Aurélio inadmitiu o MI, diante dos
limites impostos ao exercício, pelo STF, da jurisdição constitucional. Admitiu,
em parte, a ADO, para julgar, nessa extensão, improcedente o pedido, por não
assentar, peremptoriamente, que se tenha “criminalizar” no vocábulo “punirá”,
contido no inciso XLI do art. 5º da CF. Em decorrência disso, não reconheceu a
omissão legislativa quanto à criminalização específica da homofobia e da
transfobia. Concluiu que, respeitada a liberdade legiferante franqueada ao
legislador ordinário, espera-se que a sinalização do STF quanto à necessária
proteção das minorias e dos grupos socialmente vulneráveis contribua para a
formação de uma cultura livre de todo e qualquer preconceito e discriminação,
preservados os limites da separação dos Poderes e da reserva legal em termos
penais.
(1) CF/1988: “Art.
5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: (...)
XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades
fundamentais; XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e
imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;”
(2)
CF/1988: “Art. 5º (...) XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem
pena sem prévia cominação legal;”
Primeira Turma
DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITO
DE DEFESA
Possibilidade
de sustentação oral em sede de agravo regimental
A Primeira Turma, por
maioria, acolheu questão de ordem e afetou ao Plenário o julgamento de agravo
regimental interposto contra decisão monocrática que indeferiu liminar em habeas corpus. O agravante requer a
faculdade de realização de sustentação oral em sede de agravo regimental.
Vencido o ministro Edson Fachin (relator), que se
manifestou contrariamente ao encaminhamento da questão ao Plenário.
DIREITO PROCESSUAL
PENAL – AÇÃO PENAL
Aplicação indevida de
verbas públicas por prefeito: transferência para conta centralizada municipal e
ausência de proveito próprio
A Primeira Turma, por maioria, julgou procedente ação penal instaurada
contra deputado federal para condená-lo às penas cominadas no inciso III do
art. 1º do Decreto-Lei (DL) 201/1967 (1).
O parlamentar, no exercício do mandato de prefeito, aplicou
indevidamente verbas públicas federais oriundas do Fundo Nacional de Saúde
(FNS) destinadas ao programa nacional de combate a doença epidêmica para o
pagamento de débitos da Secretaria Municipal de Saúde com o instituto municipal
de previdência.
Inicialmente, o colegiado, por maioria, afastou a preliminar de
incompetência do Supremo Tribunal Federal (STF). Isso porque, embora os fatos
apurados na presente ação penal sejam estranhos ao mandato parlamentar, o
procedimento já havia alcançado e superado a fase de alegações finais, situação
processual que se enquadra em uma das hipóteses de prorrogação da competência
da Corte.
Vencido, no ponto, o ministro Marco Aurélio, que acolheu a preliminar.
Para ele, incide a incompetência por inexistir ligação entre o exercício do
mandato do parlamentar e o crime praticado por ele quando prefeito. Está-se
diante de competência funcional, absoluta.
Quanto ao mérito, a Turma entendeu que a conduta narrada na denúncia se
amolda, com precisão, ao tipo previsto no inciso III do art. 1º do DL 201/1967.
Considerou que os elementos probatórios produzidos na instrução processual
demonstram que o réu, com plena consciência da ilicitude dos seus atos, atuou
na forma descrita na peça acusatória, ausentes as causas de exclusão da
ilicitude ou da culpabilidade.
Afirmou que o crime previsto no art. 1º, III, do DL 201/1967 consiste em
o administrador público aplicar verba pública em destinação diversa da prevista
em lei. Não se trata, portanto, de desviar em proveito próprio, sendo
irrelevante a verificação de efetivo prejuízo para a Administração.
Esclareceu que, no caso, havia uma conta específica para a utilização
dessa verba federal, da qual foram transferidos valores para uma conta única do
Fundo Municipal de Saúde. Desta última, saíram os recursos destinados ao
cumprimento de uma ordem de pagamento em favor do instituto municipal de
previdência. Asseverou que nenhuma razão, salvo a tredestinação, justificaria a
transferência do dinheiro dessa conta específica para uma conta única geral.
Portanto, a mera transferência para a conta geral já seria indício grave do
desvio.
Reputou ser evidente o conhecimento do fato pelo ex-prefeito, que
assinou a ordem de pagamento para a transferência, a demonstrar domínio do fato
e o poder de gestão dos recursos efetivamente empregados em finalidade diversa
da estabelecida por lei. Observou que, na véspera da referida transferência,
houve uma reunião com os corréus na qual foi decidida a destinação das verbas.
Ressalte-se que um deles até mesmo declarou que o parlamentar sabia da operação
ilegal descrita na denúncia. Ademais, no mesmo dia da citada reunião, foi
enviado ofício do Gabinete da
Secretaria Municipal de Saúde, que fez remissão à “determinação superior” e
encaminhou à Secretaria Municipal de Finanças a relação das contas referentes
às transferências “fundo a fundo”, para que fosse processada a imediata
centralização dessas contas em uma única conta.
Vencidos os ministros Luiz Fux e Alexandre de Moraes (revisor), que
julgaram improcedente a ação penal para absolver o parlamentar, por
considerarem não comprovadas a materialidade e a autoria delitivas.
(1) DL 201/1967: “Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos
Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do
pronunciamento da Câmara dos Vereadores: (...) III – desviar, ou aplicar
indevidamente, rendas ou verbas públicas;”
DIREITO CONSTITUCIONAL – CONSELHO
NACIONAL DE JUSTIÇA
MS:
CNJ e cálculo de precatórios
A Primeira Turma
iniciou a apreciação de mandado de segurança, com pedido de medida liminar,
impetrado em face de ato do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que suspendeu o
pagamento de precatórios e determinou a realização de auditoria técnica e a
revisão nos cálculos dos precatórios, com abatimento dos valores pagos por
determinado Município.
Na situação em
apreço, o Município firmou contrato de abertura de crédito, por antecipação de
receita orçamentária, com instituição bancária. Aproximadamente um ano após,
celebrou acordo judicial com o banco para solver a dívida. Tempo depois, a
municipalidade opôs embargos à execução. Além disso, foram manejadas diversas
ações cuja causa de pedir era a abusividade das cláusulas contratuais. A
maioria dos feitos transitou em julgado.
O impetrante
sustenta que o ato impugnado excedeu a competência administrativa do CNJ.
Aponta a violação ao art. 1º-E da Lei 9.494/1997 (1), pois o CNJ teria invadido
a competência do presidente do Tribunal de Justiça ao ordenar a revisão de
cálculo dos precatórios. De igual modo, defende haver afronta à coisa julgada,
em virtude de processos decididos de maneira favorável ao impetrante.
O ministro Luiz
Fux (relator) denegou a ordem. Sublinhou que os critérios para cálculos de
precatórios têm natureza intrinsecamente administrativa, de acordo com decisões
desta Corte. Logo, o CNJ ostenta competência constitucional para determinar auditoria
técnica e revisão nos cálculos dos precatórios, bem como a suspensão de seu
pagamento.
Registrou que, na
espécie, o CNJ constatou diversas irregularidades nos cálculos dos precatórios,
ao realizar a correição. Ademais, no procedimento de revisão dos valores, foram
identificados erros grosseiros. Deste modo, a hipótese enquadrar-se-ia na
previsão normativa do art. 35 da Resolução 115/2010 do CNJ (2).
O relator adotou
postura de deferência, que é recomendável, com os órgãos autônomos
especializados, notadamente aqueles aos quais outorgado assento constitucional
de competência técnica para determinadas matérias. Portanto, a decisão do CNJ
não deve ser objeto de revisão, mormente por não ter caráter manifestamente
ilegal, abusivo ou teratológico.
Por fim, observou
que o impetrante não logrou mostrar, por meio de prova inequívoca, a violação
ao direito líquido e certo, uma vez que os documentos constantes dos autos não
demonstram, de plano, ilegalidade ou abuso de poder praticado pela autoridade
impetrada.
Em seguida, o
julgamento foi suspenso com o pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.
(1) Lei
9.494/1997: “Art. 1º-E. São passíveis de revisão, pelo Presidente do Tribunal,
de ofício ou a requerimento das partes, as contas elaboradas para aferir o
valor dos precatórios antes de seu pagamento ao credor.”
(2) Resolução
115/2010 do CNJ: “Art. 35. O pedido de revisão dos cálculos, em fase de
precatório, previsto no art. 1º-E da Lei nº 9.494/97, apenas poderá ser
acolhido desde que: I – o requerente aponte e especifique claramente quais são
as incorreções existentes nos cálculos, discriminando o montante que seria
correto, pois do contrário a incorreção torna-se abstrata; II – o defeito nos
cálculos esteja ligado à incorreção material ou à utilização de critério em
descompasso com a lei ou com o título executivo judicial; III – o critério
legal aplicável ao débito não tenha sido objeto de debate nem na fase de
conhecimento, nem na fase de execução.”
Segunda Turma
DIREITO
CONSTITUCIONAL – DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
Proteção de dados e
inviolabilidade de domicílio
A Segunda Turma iniciou julgamento de
habeas corpus em que se discute a nulidade de processo penal em que, no
âmbito de cumprimento de medida de busca e apreensão, autoridade policial teve acesso,
sem autorização judicial, ao aparelho celular do paciente, bem como às conversas
havidas no aplicativo Whatsapp.
No caso, agentes policiais
apreenderem o aparelho celular do paciente e procederem à investigação, no
aplicativo WhatsApp, de conversas
cujo teor indicaria traficância. Em seguida, os agentes ingressaram no domicílio
do paciente onde encontraram drogas e arma, o que ensejou o ajuizamento de ação
penal, cuja condenação em primeira instância foi mantida pelo tribunal de
justiça e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O ministro Gilmar Mendes (relator)
concedeu a ordem para anular as provas obtidas mediante o acesso
indevido ao aplicativo WhatsApp e à
residência do paciente. Constatada a derivação de todas as demais provas,
declarou nulo o processo e determinou o trancamento da ação e a absolvição do
paciente.
O relator asseverou ser inviolável o
sigilo das comunicações telefônicas e de dados, salvo por ordem judicial, nas
hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal
ou instrução processual penal [Constituição Federal (CF), art. 5º, XII] (1). A
inviolabilidade da vida privada e da intimidade é afirmada pelo art. 5º, X, da
Constituição Federal (2).
Sublinhou que, ao adotar interpretação
mais estrita da norma contida no art. 5º, XII, da CF, a doutrina entendia não
se aplicar a inviolabilidade das comunicações aos dados registrados. Partia-se
da compreensão de que os dados em si não eram objeto de proteção, mas somente
as comunicações realizadas.
Essa orientação foi incorporada pela
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF). No julgamento do HC 91.867, destacou-se
a diferença entre comunicação
telefônica e registros
telefônicos, os quais receberiam proteção jurídica distinta.
Naquela oportunidade, foi assentada a
impossibilidade de interpretar-se a cláusula do art. 5º, XII, da CF no sentido
de proteção aos dados como registro, depósito registral, porquanto a proteção
constitucional seria da comunicação, e não dos dados.
O relator afirmou que a modificação das circunstâncias fáticas e
jurídicas, a promulgação de leis
posteriores e o significativo desenvolvimento
das tecnologias da comunicação, do tráfego de dados e dos aparelhos smartphones levam,
contudo, nos dias atuais, a solução distinta, em um típico caso de mutação constitucional.
No âmbito infraconstitucional, as
normas dos arts. 3º, II e III; 7º, I, II, III e VII; 10 e 11 da Lei 12.965/2014
(3) – o marco civil da internet – estabelecem diversas proteções à privacidade,
aos dados pessoais, à vida privada, ao fluxo de comunicações e às comunicações
privadas dos usuários da internet.
A norma do art. 7º, III, da referida
lei é elucidativa ao prever a inviolabilidade e o sigilo das comunicações privadas armazenadas (dados
armazenados), “salvo por ordem
judicial”.
A legislação infraconstitucional
avançou, portanto, para possibilitar a proteção dos dados armazenados em
comunicações privadas, os quais somente podem ser acessados mediante prévia
decisão judicial – matéria submetida à reserva de jurisdição.
O avanço normativo nesse importante
tema da proteção do direito à intimidade e à vida privada deve ser considerado
na interpretação do alcance das normas do art. 5º, X e XII, da CF.
Tão importante quanto a alteração do contexto jurídico é a impactante
transformação das circunstâncias fáticas, que trazem novas luzes ao tema. Nesse
sentido, houve um incrível desenvolvimento dos mecanismos de comunicação e
armazenamento de dados pessoais em smartphones e telefones celulares
na última década.
Nos dias atuais, esses aparelhos são
capazes de registrar as mais variadas informações sobre seus usuários. Os
celulares são a principal forma de acesso dos brasileiros e cidadãos do País à internet. Esse motivo, por si
só, já seria suficiente para concluir pela incidência das normas sobre proteção
dos dados, dos fluxos de dados e das demais informações contidas nesses
dispositivos.
Ademais, o conceito de domicílio
abrange todo lugar privativo, ocupado por alguém, com direito próprio e de
maneira exclusiva, mesmo sem caráter definitivo ou habitual, tratando-se de
noção mais ampla do que aquela vigente no direito civil.
Nesse sentido, o acesso direto a
aparelhos telefônicos e à residência de suspeitos, sem autorização judicial,
fora das hipóteses de flagrante e sem o estabelecimento de procedimentos bem
delimitados que garantam a observância dos direitos fundamentais, também
conflita com o direito fundamental à não autoincriminação.
É por isso que essas medidas devem
ser submetidas à prévia decisão judicial, como garantia procedimental in
concreto através da qual sejam analisados e registrados,
especificamente, os fundamentos que possam afastar os direitos fundamentais
envolvidos. Ou seja, a existência de prévia decisão judicial é capaz de
demonstrar a necessidade, adequação e proporcionalidade da pretensão dos órgãos
de segurança ao acesso aos dados, às informações e à residência dos suspeitos.
Permite, ainda, o controle desses fundamentos.
Em seguida, o julgamento foi suspenso
em virtude do pedido de vista da ministra Cármen Lúcia.
(1) CF/1988: “Art. 5º Todos são
iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes: (...) XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das
comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no
último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer
para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;”
(2) CF/1988: “Art. 5º (...) X – são
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação;”
(3) Lei 12.965/2014: “Art. 3º A
disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princípios: (...) II –
proteção da privacidade; III – proteção dos dados pessoais, na forma da lei;
(...) Art. 7º O acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao
usuário são assegurados os seguintes direitos: I – inviolabilidade da
intimidade e da vida privada, sua proteção e indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação; II – inviolabilidade e sigilo do fluxo de
suas comunicações pela internet, salvo por ordem judicial, na forma da lei; III
– inviolabilidade e sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por
ordem judicial; (...) VII – não fornecimento a terceiros de seus dados
pessoais, inclusive registros de conexão, e de acesso a aplicações de internet,
salvo mediante consentimento livre, expresso e informado ou nas hipóteses
previstas em lei; (...) Art. 10. A guarda e a disponibilização dos registros de
conexão e de acesso a aplicações de internet de que trata esta Lei, bem como de
dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à
preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes
direta ou indiretamente envolvidas. (...) Art. 11. Em qualquer operação de
coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou
de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de internet em que
pelo menos um desses atos ocorra em território nacional, deverão ser
obrigatoriamente respeitados a legislação brasileira e os direitos à
privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas
e dos registros.”
DIREITO PROCESSUAL PENAL – PROVA
Reclamação:
mandado de busca e apreensão, entrevista e acesso a celular “smartphone”
A Segunda Turma,
por maioria, deu provimento parcial a reclamação para declarar a nulidade de
entrevista realizada por autoridade policial no interior da residência do
reclamante, durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão, em flagrante
contrariedade à autoridade da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) nas Arguições
de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 395 e 444.
O reclamante
sustentava ter sido interrogado por delegado de polícia sem ser informado de seu
direito ao silêncio, além de ter-lhe sido exigida a senha de acesso ao seu smartphone,
em flagrante violação ao princípio da não autoincriminação.
No tocante à
entrevista, prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes (relator). Em seu
pronunciamento, observou que, nas ADPFs 395 e 444, a Corte decidiu pela
impossibilidade de se conduzir coercitivamente os suspeitos de prática de
crimes com o intuito de serem interrogados. Entre o rol de direitos
potencialmente atingidos pela conduta, destacou a violação do direito à não autoincriminação
e ao silêncio.
Aduziu que a
contrariedade aos referidos direitos ocorreu com a realização de interrogatório
travestido de entrevista, na medida em que utilizada técnica de interrogatório
forçado, proibida a partir do julgamento das ADPFs 395 e 444. Observou que o
reclamante foi interrogado em ambiente intimidatório que diminuiria o direito à
não incriminação. Além disso, na entrevista formalmente documentada, não se
oportunizou ao sujeito da diligência o direito à prévia consulta a advogado,
tampouco certificou-se, no respectivo termo, o direito ao silêncio e à não produção
de provas contra si mesmo, nos termos da legislação e dos aludidos precedentes.
Por sua vez, o
ministro Edson Fachin ressaltou não se tratar, na hipótese, de aderência estrita
de um conjunto de elementos fáticos que se submeteriam à vedação da condução
coercitiva. Contudo, assinalou a existência de desrespeito ao direito de não
incriminação e ao direito ao silêncio, conforme os fatos apresentados. Isso
ocorreu mediante metodologia atípica e descolada de qualquer fundamentação que
permita esse tipo de procedimento.
Quanto à conduta
adotada pela autoridade policial em relação ao celular do reclamante, o
colegiado, por maioria, não vislumbrou suporte à sua alegação no sentido de que
teria sido coagido ou obrigado a fornecer a senha. Explicitou inexistir
expressamente, na decisão judicial, a expressão “autorizo a apreensão do
aparelho celular”. Entretanto, o ato decisório conteve o deferimento ao acesso,
à exploração e cópia do conteúdo de mídias, dispositivos e dados armazenados em
nuvem, bem assim a determinação de que deveria constar, expressamente no
mandado, a autorização de acesso a dados telefônicos e telemáticos armazenados
nos dispositivos eletrônicos apreendidos.
O ministro Ricardo
Lewandowski acrescentou não ser possível exigir do juiz que minudencie todos os
objetos de interesse do processo que serão encontrados no local da busca e
apreensão.
No ponto, ficou
vencido o ministro relator, que reconheceu, de ofício [Código de Processo Penal
(CPP), art. 654, § 2º (1)], a inconstitucionalidade e a ilegalidade da
apreensão e do acesso aos dados, às mensagens e informações contidas no
aparelho celular, haja vista a ausência de prévia e fundamentada decisão
judicial que justificasse a necessidade, a adequação e a proporcionalidade da
medida.
(1) CPP: “Art.
654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu
favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público. (...) § 2º Os juízes e os
tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus,
quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência
de sofrer coação ilegal.”
DIREITO PENAL – EXECUÇÃO
PROVISÓRIA
Execução
provisória e Súmula 122 do TRF da 4ª Região
A
Segunda Turma decidiu afetar ao Plenário o julgamento de agravo regimental
interposto contra decisão que negou seguimento a habeas corpus impetrado em favor de todos aqueles presos em
razão da aplicação do Enunciado 122 da Súmula do Tribunal Regional Federal
(TRF) da 4ª Região (1). A defesa alega ter sido o referido enunciado aplicado
sem qualquer critério a fundamentar a execução provisória das penas impostas
pelo TRF da 4ª Região.
(1)
Enunciado 122 da Súmula do TRF da 4ª Região: “Encerrada a jurisdição criminal
de segundo grau, deve ter início a execução da pena imposta ao réu,
independentemente da eventual interposição de recurso especial ou
extraordinário.”
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