sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Informativo n.º 995 - STF

A inobservância do prazo nonagesimal do art. 316 do Código de Processo Penal (CPP) (1) não implica automática revogação da prisão preventiva, devendo o juízo competente ser instado a reavaliar a legalidade e a atualidade de seus fundamentos.

 

O disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP insere-se em um sistema a ser interpretado harmonicamente, sob pena de se produzirem incongruências deletérias à processualística e à efetividade da ordem penal. A exegese que se impõe é a que, à luz do caput do artigo, extrai-se a regra de que, para a revogação da prisão preventiva, o juiz deve fundamentar a decisão na insubsistência dos motivos que determinaram sua decretação, e não no mero decurso de prazos processuais.

O Supremo Tribunal Federal (STF) rechaça interpretações que associam, automaticamente, o excesso de prazo ao constrangimento ilegal da liberdade, tendo em vista: a) o critério de razoabilidade concreta da duração do processo, aferido à luz da complexidade de cada caso, considerados os recursos interpostos, a pluralidade de réus, crimes, testemunhas a serem ouvidas, provas periciais a serem produzidas, etc.; e b) o dever de motivação das decisões judiciais [Constituição Federal (CF), art. 93, IX] (2), que devem sempre se reportar às circunstâncias específicas dos casos concretos submetidos a julgamento, e não apenas aos textos abstratos das leis.

À luz desta compreensão jurisprudencial, o disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP não conduz à revogação automática da prisão preventiva. Ao estabelecer que “Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal”, o dispositivo não determina a revogação da prisão preventiva, mas a necessidade de fundamentá-la periodicamente.

Mais ainda: o parágrafo único do art. 316 não fala em prorrogação da prisão preventiva, não determina a renovação do título cautelar. Apenas dispõe sobre a necessidade de revisão dos fundamentos da sua manutenção. Logo, não se cuida de prazo prisional, mas prazo fixado para a prolação de decisão judicial.

Portanto, a ilegalidade decorrente da falta de revisão a cada 90 dias não produz o efeito automático da soltura, porquanto esta, à luz do caput do dispositivo, somente é possível mediante decisão fundamentada do órgão julgador, no sentido da ausência dos motivos autorizadores da cautela, e não do mero transcorrer do tempo.

No caso, trata-se de referendo de decisão do presidente do STF que, em sede de plantão judiciário, após reconhecer a existência de risco de grave lesão à ordem e à segurança pública, concedeu a suspensão de medida liminar proferida nos autos do HC 191.836/SP e determinou a imediata prisão do paciente. A periculosidade do agente do writ em foco para a segurança pública resta evidente, ante a gravidade concreta do crime (tráfico transnacional de mais de 4 toneladas de cocaína, mediante organização criminosa violenta e que ultrapassa as fronteiras nacionais) e a própria condição de liderança de organização criminosa de tráfico de drogas atribuída ao paciente, reconhecida nas condenações antecedentes que somam 25 anos.

Com esse entendimento, o Plenário, por maioria, referendou a decisão em suspensão de liminar, com a consequente confirmação da suspensão da decisão proferida nos autos do HC 191.836/SP até o julgamento do writ pelo órgão colegiado competente, determinando-se a imediata prisão do paciente, nos termos do voto do ministro Luiz Fux (presidente e relator), vencido o ministro Marco Aurélio, que inadmitia a possibilidade de presidente cassar individualmente decisão de um integrante do STF. O ministro Ricardo Lewandowski, preliminarmente, não conhecia da suspensão e, vencido, ratificou a liminar.


É constitucional a percepção de honorários de sucumbência por procuradores de estados-membros, observado o teto previsto no art. 37, XI, da Constituição Federal (CF) (1) no somatório total às demais verbas remuneratórias recebidas mensalmente.

Aplicam-se ao problema jurídico-constitucional os precedentes formados pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de ações diretas de inconstitucionalidade acerca da validade de textos legais que instituíram a percepção de honorários de sucumbência por advogados públicos, cujos conteúdos normativos são semelhantes (ADI 6.053, ADI 6.165, ADI 6.178).

A natureza constitucional dos serviços prestados pelos advogados públicos possibilita o recebimento da verba de honorários sucumbenciais, nos termos da lei, desde que submetido ao mencionado teto remuneratório. Restaram definidas cinco razões de decidir: (i) os honorários de sucumbência constituem vantagem de natureza remuneratória, por serviços prestados com eficiência no desempenho da função pública; (ii) os titulares dos honorários sucumbenciais são os profissionais da advocacia, seja pública ou privada; (iii) o art. 135 da CF (2), ao estabelecer que a remuneração dos procuradores estaduais se dá mediante subsídio, é compatível com o regramento constitucional referente à advocacia pública; (iv) a CF não institui incompatibilidade relevante que justifique vedação ao recebimento de honorários por advogados públicos, à exceção da magistratura e do Ministério Público; e (v) a percepção cumulativa de honorários sucumbenciais com outras parcelas remuneratórias impõe a observância do teto remuneratório estabelecido constitucionalmente no art. 37, XI.


As disposições da Lei 9.656/1998, à luz do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal (CF), somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como sobre os contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados.

 

Isso porque as relações jurídicas livremente pactuadas, com o uso da autonomia da vontade, devem dar valor à segurança jurídica, conferindo-se estabilidade aos direitos subjetivos e, mais ainda, conhecimento inequívoco das regras às quais todos estão vinculados, bem como a tão importante previsibilidade das consequências de suas respectivas condutas. Nesses termos, dentro do debate sobre a possibilidade de retroatividade da Lei 9.656/1998 a negócios jurídicos anteriores à sua vigência, serão aplicáveis previsões constitucionais a preservar o ato jurídico perfeito, a segurança jurídica e, por sua relevância, a autonomia da vontade e a liberdade de contratar.

Além disso, o entendimento que tem sido consolidado no Supremo Tribunal Federal (STF) ao longo dos anos é contrário à possibilidade da retroatividade da lei nova, assegurando a máxima efetividade da norma constitucional carreada pelo art. 5º, XXXVI, da CF, ressalvada a aplicação da chamada retroatividade mínima, em situações excepcionais, a permitir sejam temperadas para o futuro algumas relações jurídicas constituídas no passado. Desse modo, os contratos de planos de saúde firmados antes do advento da Lei 9.656/1998 podem ser considerados atos jurídicos perfeitos, e, como regra geral, estão blindados às mudanças supervenientes das regras vinculantes.

Ademais, nos termos do art. 35 da Lei 9.656/1998, assegurou-se, aos beneficiários dos contratos celebrados anteriormente ao início de sua vigência, a possibilidade de opção pelas novas regras, tendo o parágrafo 4° do mencionado dispositivo proibido que a migração fosse feita unilateralmente pela operadora.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 123 da repercussão geral, deu provimento a recurso extraordinário para julgar improcedente o pedido inicial.


A ausência do título de eleitor no momento da votação não constitui, por si só, óbice ao exercício do sufrágio.

O art. 91-A da Lei 9.504/1997, com a redação dada pela Lei 12.034/2009, e o art. 47, § 1º, da Resolução 23.218/2010 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com o objetivo de combater a fraude eleitoral, determinaram, para o exercício do sufrágio, a apresentação concomitante do título eleitoral e de documento oficial com foto.

Com o advento da biometria, no entanto, a discussão quanto à utilização de documentos de identificação diversos da biometria perdeu força, mas não foi de todo esvaziada. Há situações em que os eleitores serão identificados pelo modo tradicional, mediante apresentação de documento com foto: (a) eleitores ainda não cadastrados biometricamente; (b) inviabilização na utilização da biometria no dia da votação, por indisponibilidade momentânea ou ocasional do sistema ou impossibilidade de leitura das informações datiloscópicas do eleitor (impressão digital); ou (c) para o eleitorado geral, em situações excepcionais, como a que ocorre nas eleições municipais de 2020, ante o cenário deflagrado pela pandemia da Covid-19.

A análise da questão, sob o prisma do princípio da proporcionalidade, revela que o documento oficial com foto para identificação do eleitor é medida suficiente e adequada para garantir a autenticidade do voto, sendo desnecessária a exigência do título. Embora se reconheça que as reformas legislativas provocaram avanços significativos no sistema eleitoral, na hipótese vertente, o mecanismo imaginado para frear as investidas fraudulentas criou óbice desnecessário ao exercício do voto pelo eleitor. Isso porque, com a imposição da limitação, alguns eleitores, regularmente alistados, seriam alijados de participar do processo eleitoral caso não estivessem portando o título eleitoral no dia da votação, com eventuais reflexos na soberania popular e no próprio processo democrático.

Aplicável à hipótese, ademais, a “proibição do retrocesso”, uma vez que já conquistado pela sociedade o direito à autenticidade do voto, mediante a identificação do eleitor pela biometria, bem assim, de forma secundária, por documento com fotografia, a afastar qualquer entendimento segundo o qual a ausência do título eleitoral, no momento da votação, impede o exercício do voto.

Com base nesse entendimento, o Plenário confirmou medida cautelar e julgou procedente pedido formulado em ação direta para conferir interpretação conforme à Constituição aos arts. 91-A da Lei 9.504/1997 e 47, § 1º, da Resolução TSE 23.218/2010.

 

ADI 4467/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgamento virtual finalizado em 19.10.2020. (ADI-4467)


A entidade que não representa a totalidade de sua categoria profissional não possui legitimidade ativa para ajuizamento de ações de controle concentrado de constitucionalidade.

A Constituição Federal (CF) estabelece, em seu art. 103, o rol de legitimados para a propositura de ações de controle concentrado de constitucionalidade, dentre os quais estão as confederações sindicais e entidades de classe [CF, art. 103, IX (1)].

O Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento de que a legitimidade para o ajuizamento das ações de controle concentrado de constitucionalidade por parte de confederações sindicais e entidades de classe pressupõe: (a) a caracterização como entidade de classe ou sindical, decorrente da representação de categoria empresarial ou profissional; (b) a abrangência ampla desse vínculo de representação, exigindo-se que a entidade represente toda a respectiva categoria, e não apenas fração dela; (c) o caráter nacional da representatividade, aferida pela demonstração da presença da entidade em pelo menos 9 (nove) estados brasileiros; e (d) a pertinência temática entre as finalidades institucionais da entidade e o objeto da impugnação.

À vista disso, o Plenário, por maioria, conheceu do agravo regimental e negou-lhe provimento por entender que a entidade não representa toda a respectiva categoria profissional e, dessa forma, carece de legitimidade ativa para propositura da ação.


Não retroage a norma prevista no § 5º do art. 171 do Código Penal (CP) (1), incluída pela Lei 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”), que passou a exigir a representação da vítima como condição de procedibilidade para a instauração de ação penal, nas hipóteses em que o Ministério Público tiver oferecido a denúncia antes da entrada em vigor do novo diploma legal.

A norma processual anteriormente vigente definia a ação penal para o delito de estelionato, em regra, como pública incondicionada. Desse modo, nos casos em que já oferecida a denúncia, tem-se a concretização de ato jurídico perfeito, o que obstaculiza a interrupção da ação penal.

Por outro lado, por tratar-se de “condição de procedibilidade da ação penal”, a aplicação da regra prevista no § 5º do art. 171 do CP, com redação dada pela Lei 13.964/2019, será obrigatória em todas as hipóteses em que ainda não tiver sido oferecida a denúncia pelo Parquet, independentemente do momento da prática da infração penal, nos termos do art. 2º, do Código de Processo Penal (CPP) (2). Entendimento diverso demandaria expressa previsão legal, pois se estaria transformando a “representação da vítima”, clássica condição de procedibilidade, em verdadeira “condição de prosseguibilidade da ação penal”, alterando sua tradicional natureza jurídica. A representação da vítima somente estaria dispensada nas situações expressamente previstas no §5º do art. 171 do CP, uma vez que outros bens jurídicos estariam afetados.


DIREITO CONSTITUCIONAL E DIREITO CIVIL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. BUSCA E APREENSÃO DOS BENS. ART. 3º DO DECRETO-LEI 911/69. CONSTITUCIONALIDADE. Recurso Extraordinário a que se dá provimento para afastar a extinção de ofício do processo e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para o prosseguimento do julgamento do agravo de instrumento. Fixada a seguinte tese de julgamento: "O art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69 foi recepcionado pela Constituição Federal, sendo igualmente válidas as sucessivas alterações efetuadas no dispositivo”.

DIREITO CONSTITUCIONAL E DO TRABALHO. REPERCUSSÃO GERAL. CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL AUTÔNOMA, REGIDO PELA LEI nº 4.886/65. NÃO CONFIGURAÇÃO DE RELAÇÃO DE TRABALHO PREVISTA NO ART. 114, CF. 1. Recurso Extraordinário interposto contra decisão proferida pelo Tribunal Superior do Trabalho, em que se alega afronta ao art. 114, incisos I e IX, da Constituição Federal, com redação dada pela EC 45/2004. Na origem, cuida-se de ação de cobrança de comissões sobre vendas decorrentes de contrato de representação comercial autônoma, ajuizada pelo representante, pessoa física, em face do representado. 2. As atividades de representação comercial autônoma configuram contrato típico de natureza comercial, disciplinado pela Lei nº 4.886/65, a qual prevê (i) o exercício da representação por pessoa jurídica ou pessoa física, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para a realização de negócios mercantis e (ii) a competência da Justiça comum para o julgamento das controvérsias que surgirem entre representante e representado. 3. Na atividade de representação comercial autônoma, inexiste entre as partes vínculo de emprego ou relação de trabalho, mas relação comercial regida por legislação especial (Lei n° 4.886/65). Por conseguinte, a situação não foi afetada pelas alterações introduzidas pela EC n° 45/2004, que versa sobre hipótese distinta ao tratar da relação de trabalho no art. 114 da Constituição. 4. A proteção constitucional ao trabalho não impõe que toda e qualquer relação entre o contratante de um serviço e o seu prestador seja protegida por meio da relação de trabalho (CF/1988, art. 7º). Precedentes. 5. Ademais, os autos tratam de pedido de pagamento de comissões atrasadas. O pedido e a causa de pedir não têm natureza trabalhista, a reforçar a competência do Juízo Comum para o julgamento da demanda. 6. Recurso extraordinário a que se dá provimento, para assentar a competência da Justiça comum, com a fixação da seguinte tese: “Preenchidos os requisitos dispostos na Lei 4.886/65, compete à Justiça Comum o julgamento de processos envolvendo relação jurídica entre representante e representada comerciais, uma vez que não há relação de trabalho entre as partes”.

DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. CÁLCULO DO VALOR DO BENEFÍCIO DE COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA DEVIDA POR ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA FECHADA. CONTRATO QUE PREVÊ A APLICAÇÃO DE PERCENTUAIS DISTINTOS PARA HOMENS E MULHERES. QUEBRA DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. 1. A isonomia formal, assegurada pelo art. 5º, I, CRFB, exige tratamento equitativo entre homens e mulheres. Não impede, todavia, que sejam enunciados requisitos de idade e tempo de contribuição mais benéficos às mulheres, diante da necessidade de medidas de incentivo e de compensação não aplicáveis aos homens. 2. Incidência da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, com prevalência das regras de igualdade material aos contratos de previdência complementar travados com entidade fechada. 3. Revela-se inconstitucional, por violação ao princípio da isonomia (art. 5º, I, da Constituição da República), cláusula de contrato de previdência complementar que, ao prever regras distintas entre homens e mulheres para cálculo e concessão de complementação de aposentadoria, estabelece valor inferior do benefício para as mulheres, tendo em conta o seu menor tempo de contribuição. 5. Recurso extraordinário conhecido e desprovido.


Informativo n.º 680 - STJ

 A copropriedade anterior à abertura da sucessão impede o reconhecimento do direito real de

habitação.


É absoluta a competência do local em que se encontra o principal estabelecimento para processar e julgar pedido de recuperação judicial, que deve ser aferido no momento de propositura da demanda, sendo irrelevantes para esse fim modificações posteriores de volume negocial


É aplicável ao INSS a multa prevista no art. 334, § 8°, do CPC/2015, quando a parte autora

manifestar interesse na realização da audiência de conciliação e a autarquia não comparecer no

feito, mesmo que tenha manifestando seu desinteresse previamente.


Não é cabível a requisição da averbação de inquérito civil no registro imobiliário pelo Ministério Público, com fixação de prazo para o seu cumprimento O Parquet, no caso, ao invés de requerer a averbação, requisitou a sua realização, fixando prazo para o seu cumprimento, o que não encontra amparo na legislação.

Em que pese a importância de se dar publicidade à população acerca de eventuais irregularidades em parcelamentos, a fim de proteger terceiros de boa-fé, adquirentes de suas frações, e contribuir para a ordenada ocupação do solo, há que se observar o devido processo legal, assegurado no art. 5º, LIV, da CF, tal como previsto na Lei n. 6.015/1973 Não é possível o reconhecimento de ofício do direito ao recebimento de indenização por benfeitorias úteis ou necessárias em ação possessória.

Apesar do entendimento de que a indenização por benfeitorias passou a ser consequência lógica da resolução do contrato de compra e venda, a formulação de pedido não restou afastada. Esta Corte Superior, ao julgar o REsp 764.529/RS (3ª Turma, DJe 09/11/2010), apenas afastou o instituto da preclusão, de modo a possibilitar a formulação de pedido após a contestação. A jurisprudência do STJ, portanto, não excepciona a formulação de pedido referente à indenização das benfeitorias, somente o momento do requerimento e a forma como esse é realizado

Na atividade de securitização de créditos condominiais, os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) valem-se do instituto da cessão de créditos e, ao efetuarem o pagamento das cotas condominiais inadimplidas, sub-rogam-se na mesma posição do condomínio cedente, com todas as prerrogativas legais a ele conferidas.

É válida hipoteca firmada na vigência do CC/2002 exclusivamente por cônjuge casado sob o

regime da separação total de bens na vigência do CC/1916.

Assim, em se tratando de casamento celebrado na vigência do CC/1916 sob o regime da

separação convencional de bens, somente aos negócios jurídicos celebrados na vigência da

legislação revogada é que se poderá aplicar a regra do art. 235, I, do CC/1916, que previa a

necessidade de autorização conjugal como condição de eficácia da hipoteca, independentemente do regime de bens. Contudo, aos negócios jurídicos celebrados após a entrada em vigor do CC/2002, deverá ser aplicada a regra do art. 1.647, I, do CC/2002, que prevê a dispensa de autorização conjugal como condição de eficácia da hipoteca quando o regime de bens for o da separação absoluta, ainda que se trate de casamento celebrado na vigência da legislação civil revogada.

Ex-empregado mantido no plano de saúde por mais de dez anos após a demissão, por liberalidade do ex-empregador e com assunção de custeio integral do serviço, não poderá ser excluído da cobertura do seguro.

É desnecessária a inclusão dos parentes colaterais do de cujus no polo passivo da ação de

reconhecimento e dissolução de união estável post mortem.

Os provedores de aplicações de internet não são obrigados a guardar e fornecer dados pessoais dos usuários, sendo suficiente a apresentação dos registros de número IP.

Há necessidade de ajuizamento de ação autônoma para pleitear a prestação de contas relativa à venda extrajudicial em ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente.

Configura quebra antecipada do contrato (antecipatory breach) o pedido de resolução do contrato de compra e venda com pacto de alienação fiduciária em garantia por desinteresse do adquirente, mesmo que ainda não tenha havido mora no pagamento das prestações.

No contrato de compra e venda celebrado, em que presente alienação fiduciária em garantia, há de ser acatada a possibilidadede de resolução do contrato pelo desinteresse do adquirente em permanecer com o bem, mas a devolução dos valores pagos pelo autor não se dará na forma do art. 53 do CDC, em que, ressarcidas as despesas do vendedor mediante a retenção de parte do pagamento, devolve-se o restante ao adquirente.

A devolução dos valores pagos deverá observar o procedimento estabelecido nos arts. 26 e 27 da Lei n. 9.514/1997, pelo qual, resolvido o contrato de compra e venda, consolida-se a propriedade na pessoa do credor fiduciário, para, então, submeter-se o bem a leilão, na forma dos §§1º e 2º do art. 27, satisfazendo-se o débito do devedor demandante ainda inadimplido e solvendo-se as demais dívidas relativas ao imóvel, para devolver-se o que sobejar ao adquirente, se sobejar.

É admissível a reconvenção sucessiva, também denominada de reconvenção à reconvenção,

desde que a questão que justifique a propositura tenha surgido na contestação ou na primeira

reconvenção.

Se proferida, transitada e executada a sentença que julgou a primeira fase da ação de prestação de contas na vigência do CPC/1973, adquire o vencedor o direito de exigir que sejam elas prestadas e apuradas na forma da lei revogada.

Quando há pluralidade de réus, a data da primeira citação válida é o termo inicial para contagem dos juros de mora.

É legal o auxílio da agência de inteligência ao Ministério Público Estadual durante procedimento criminal instaurado para apurar graves crimes em contexto de organização criminosa.

Não há infiltração policial quando agente lotado em agência de inteligência, sob identidade falsa, apenas representa o ofendido nas negociações da extorsão, sem se introduzir ou se infiltrar na organização criminosa com o propósito de identificar e angariar a confiança de seus membros ou obter provas sobre a estrutura e o funcionamento do bando.

As inovações do Pacote Anticrime na Lei n. 9.296/1996 não alteraram o entendimento de que é lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro.

A ação controlada prevista no § 1° do art. 8° da Lei n. 12.850/2013 independe de autorização,

bastando sua comunicação prévia à autoridade judicial.

Até mesmo nos casos em que a autorização judicial é prevista, quando se trata de investigação de crimes da Lei de Drogas, o descumprimento do art. 53, I, da Lei n. 11.343/2003 não autoriza, de forma automática, a declaração de invalidade da prova.

Deveras, a autorização (art. 53, I, da Lei n. 11.343/2003) ou a comunicação judicial (art. 8° da Lei n. 12.850/2013) não visam a preservar a intimidade do cidadão, como ocorre com a interceptação telefônica ou a busca e apreensão, de forma a evitar violações a direitos e garantias fundamentais, mas "a proteger o próprio trabalho investigativo, afastando eventual crime de prevaricação ou infração administrativa por parte do agente policial que aguarda, observa e monitora a atuação dos suspeitos e não realiza a prisão em flagrante assim que toma conhecimento acerca da ocorrência do delito" (REsp 1.655.072/MT, Rel. Ministro Rogerio Schietti, Sexta Turma, DJe 20/2/2018).

Com as inovações da Lei n. 13.964/2019, o legislador passou a admitir a ação controlada para apuração de crimes de lavagem de dinheiro (art. 1°, § 6°, da Lei n. 9.613/1998) e, ainda, a atuação de agentes de polícia infiltrados virtuais (art. 10-A da Lei n. 12.850/2013) com o propósito de investigar os crimes previstos na Lei de Organização Criminosa e a eles conexos.

A obrigação de revisar, a cada 90 (noventa) dias, a necessidade de se manter a custódia cautelar (art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal) é imposta apenas ao juiz ou tribunal que decretar a prisão preventiva.





LEI Nº 14.075, DE 22 DE OUTUBRO DE 2020

 

Dispõe sobre a conta do tipo poupança social digital; e altera as Leis nos 13.982, de 2 de abril de 2020, e 14.058, de 17 de setembro de 2020.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º  Esta Lei dispõe sobre a conta do tipo poupança social digital.

Art. 2º  A conta do tipo poupança social digital possuirá as seguintes características:

I – observância das disposições legais e regulamentares aplicáveis às contas de depósitos de poupança, no que couber;

II – dispensa de apresentação de documentos dos titulares que tenham sido previamente cadastrados pela instituição financeira, pelo agente operador ou pelo órgão público responsável;

III – admissão de assinatura digital de contratos e de declarações, observada a sua regulamentação;

IV – movimentação preferencialmente pelos canais digitais, com a possibilidade de, a critério da instituição financeira, ser emitido cartão físico para sua movimentação;

V – possibilidade de recebimento de outros créditos além dos depósitos decorrentes de pagamento de benefícios sociais de responsabilidade da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

VI – limite total de ingressos mensais no valor de até R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com a possibilidade de o beneficiário, a qualquer tempo, realizar a complementação dos dados cadastrais e requerer a ampliação dos serviços e dos limites;

VII – isenção de cobrança de tarifas de manutenção, observada a regulamentação específica editada pelo Conselho Monetário Nacional;

VIII – disponibilidade de, no mínimo, 3 (três) transferências eletrônicas de valores ao mês, sem custos, para conta mantida em qualquer instituição autorizada a operar pelo Banco Central do Brasil;

IX – possibilidade de ser usada para o pagamento de boletos bancários e de contas de instituições conveniadas e para outras modalidades de movimentação, na forma prevista em regulamentação do Banco Central do Brasil;

X – possibilidade de, a qualquer tempo e sem custo, ser:

a) convertida em conta de depósito à vista ou de poupança em nome do titular; e

b) encerrada pelo beneficiário de forma simplificada, pelos mesmos canais de atendimento remoto disponíveis para a sua movimentação.

§ 1º  O Conselho Monetário Nacional poderá aumentar o valor previsto no inciso VI do caput deste artigo.

§ 2º  A instituição financeira que efetuar a abertura automática da conta de que trata este artigo não poderá utilizar os dados pessoais, bancários ou fiscais fornecidos por órgãos da administração pública ou por outras instituições do sistema financeiro para outros fins, nem os ceder a terceiros, exceto mediante autorização expressa do interessado.

§ 3º  A instituição financeira que efetuar a abertura automática de conta do tipo poupança social digital deverá disponibilizar ferramenta de consulta informatizada, por meio de sítio eletrônico e de aplicativo, que permita ao cidadão verificar a existência de conta do tipo poupança social digital aberta em seu nome, a partir de seu registro no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia e de seus dados pessoais.

§ 4º  É vedado às instituições financeiras efetuar descontos ou qualquer espécie de compensação que impliquem a redução do valor do benefício a pretexto de recompor saldo negativo ou de saldar dívidas preexistentes.

Art. 3º  A conta do tipo poupança social digital poderá ser aberta de forma automática para o pagamento:

I – do auxílio emergencial previsto no § 9º do art. 2º da Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020;

II – dos benefícios previstos nos arts. 5º e 18 da Lei nº 14.020, de 6 de julho de 2020;

III – do abono de que trata o § 3º do art. 239 da Constituição Federal;

IV – do saque pelos trabalhadores titulares de contas vinculadas no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) decorrentes das situações:

a) previstas no caput do art. 6º da Medida Provisória nº 946, de 7 de abril de 2020, observado o disposto nos §§ 3º, 4º e 5º do referido artigo;

b) tratadas nos incisos XVI e XX do caput do art. 20 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990; e

c) estabelecidas no caput do art. 20 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, a critério do Conselho Curador do FGTS, ou em lei específica, quando o saque for realizado por grande quantidade de trabalhadores; e

V – de depósitos decorrentes de pagamento de benefícios sociais de responsabilidade da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, excluídos os benefícios previdenciários.

§ 1º  Na hipótese de que trata a alínea “a” do inciso IV do caput deste artigo, os valores provenientes do FGTS permanecerão disponíveis para movimentação pelo trabalhador até 30 de novembro de 2020 e, caso não sejam sacados, retornarão à conta vinculada no FGTS de titularidade do trabalhador, situação em que a rentabilidade aplicável à conta vinculada no período será garantida pela Caixa Econômica Federal.

§ 2º  Os valores retornados à conta vinculada de titularidade do trabalhador no FGTS, nos termos do § 1º deste artigo, poderão ser sacados na forma estabelecida no art. 6º da Medida Provisória nº 946, de 7 de abril de 2020, mediante solicitação expressa do trabalhador ao agente operador do FGTS.

§ 3º  Nas hipóteses de que tratam as alíneas “b” e “c” do inciso IV do caput deste artigo, os valores provenientes do FGTS permanecerão disponíveis para movimentação pelo trabalhador pelo prazo de 90 (noventa) dias, conforme cronograma estabelecido pela Caixa Econômica Federal, e, caso não sejam sacados, retornarão à conta vinculada no FGTS de titularidade do trabalhador.

§ 4º  Em caso de retorno dos valores à conta vinculada no FGTS, nos termos do § 1º deste artigo, a Caixa Econômica Federal garantirá a rentabilidade aplicável aos valores retornados no período.

§ 5º  Para o pagamento de benefícios previdenciários por meio da conta do tipo poupança social digital, o beneficiário deverá autorizar expressamente a abertura de conta ou a utilização de conta já aberta em seu nome.

Art. 4º O interstício entre movimentações e as demais disposições regulamentares relativas ao inciso XVI do caput do art. 20 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, não serão aplicados ao saque de recursos das contas vinculadas no FGTS previsto no art. 6º da Medida Provisória nº 946, de 7 de abril de 2020.

Art. 5º  A atribuição da Caixa Econômica Federal estabelecida no § 3º do art. 6º da Medida Provisória nº 946, de 7 de abril de 2020, estende-se às contas do tipo poupança social digital que receberem recursos oriundos das contas vinculadas no FGTS.

Art. 6º  O art. 2º da Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 2º ......................................................................................................

........................................................................................................................

§ 9º  ...........................................................................................................

.........................................................................................................................

III – ao menos, 3 (três) transferências eletrônicas de valores ao mês, sem custos, para conta mantida em instituição autorizada a operar pelo Banco Central do Brasil;

........................................................................................................................

V – não passível de emissão de cheques ou de ordens de pagamento para a sua movimentação.

................................................................................................................” (NR)

Art. 7º O art. 2º da Lei nº 14.058, de 17 de setembro de 2020, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 2º  ....................................................................................................

......................................................................................................................

§ 2º ..........................................................................................................

......................................................................................................................

III – direito a, no mínimo, 3 (três) transferências eletrônicas de valores e a 1 (um) saque ao mês, sem custos, para conta mantida em instituição autorizada a operar pelo Banco Central do Brasil; e

IV – vedação de emissão de cheque.

...................................................................................” (NR)

Art. 8º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 

Brasília,  22  de outubro de 2020; 199o da Independência e 132o da República. 

JAIR MESSIAS BOLSONARO
Paulo Guedes

Este texto não substitui o publicado no DOU de 23.10 de 2020


quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Informativo TSE

 A existência de parentesco não é suficiente, por si só, para proibir contratação de prestação

de serviço em campanha eleitoral pago com recursos do Fundo Partidário ou do Fundo

Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), não sendo aplicável, em tal hipótese, a Súmula

Vinculante nº 131.

Todavia, ocorrendo a contratação de parentes mediante pagamento com tais recursos, devem

ser observados com rigor ainda maior os postulados norteadores da realização de despesas com

dinheiro público, quais sejam, os princípios da moralidade, da impessoalidade, da transparência,

da razoabilidade e da economicidade.

Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão de Tribunal Regional Eleitoral que

desaprovou as contas de campanha de candidato ao cargo de deputado estadual nas Eleições

2018 e determinou a devolução de valores empregados na contratação de parente para prestação

de serviço na campanha eleitoral.

O Ministro Sérgio Banhos, relator, destacou a compreensão desta Corte “de que a observância do

princípio da economicidade na aplicação de recursos públicos pode ser objeto de controle em

processo de prestação de contas, assim como se assentou que é possível considerar irregular a

despesa que tenha caráter antieconômico”.

Na hipótese de haver uso de recursos oriundos do FEFC ou do Fundo Partidário na contratação de

parentes para prestar serviços de qualquer natureza na campanha do candidato, o relator destacou

que esse contrato “deve observar rigorosamente os princípios constitucionais da razoabilidade,

da moralidade e da economicidade”. Acrescentou que esses casos devem “evidenciar elevado

grau de transparência, a fim de que sejam, de forma satisfatória, demonstradas as peculiaridades

da transação, as atividades efetivamente desenvolvidas e a compatibilidade dos custos com

valores de mercado”.

No entanto, entendeu que no âmbito das companhas eleitorais é inaplicável a vedação de

contratação de parentes expressa na Súmula Vinculante nº 13, uma vez que a restrição à liberdade

de nomeação contida no verbete incide apenas ao “exercício de cargo em comissão, cargo de

confiança ou função gratificada na administração pública direta e indireta”.

O ministro votou pela mantença da condenação do recorrente à devolução dos valores

correspondentes ao pagamento do parente contratado, por entender que, no caso concreto,

o montante pago mostrou-se desproporcional, além de não ter sido demonstrada a efetiva

prestação de serviços.



O Plenário do TSE fixou a seguinte tese: “o conceito de rendimento bruto para fins de doação

de pessoas físicas para campanhas (atual art. 23, § 1º, da Lei nº 9.504/1997) compreende toda

e qualquer renda obtida no ano-calendário anterior ao da eleição, tributável ou não, desde que

constitua produto do capital e/ou do trabalho e que resulte em real disponibilidade econômica,

informada na declaração de imposto de renda”.

Vencido o relator, Ministro Og Fernandes, ao entendimento de que o parâmetro seria o

rendimento bruto do doador auferido no ano anterior ao da eleição, e não a sua capacidade

financeira ou o valor de seu patrimônio.


1. É possível a utilização de assinatura eletrônica legalmente válida nas fichas ou listas

expedidas pela Justiça Eleitoral para apoiamento à criação de partido político, desde que haja

prévia regulamentação pelo TSE e desenvolvimento de ferramenta tecnológica para aferir a

autenticidade das assinaturas.

2. Consulta respondida nesses termos.


Boletim 137 STF precedentes

 “Surge constitucional lei de iniciativa parlamentar a criar conselho de representantes da sociedade civil, integrante da estrutura do Poder Legislativo, com atribuição de acompanhar ações do Executivo”.

Preenchidos os requisitos dispostos na Lei 4.886/65, compete à Justiça Comum o julgamento de processos envolvendo relação jurídica entre representante e representada comerciais, uma vez que não há relação de trabalho entre as partes.

É inconstitucional, por violação ao princípio da isonomia (art. 5º, I, da Constituição da República), cláusula de contrato de previdência complementar que, ao prever regras distintas entre homens e mulheres para cálculo e concessão de complementação de aposentadoria, estabelece valor inferior do benefício para as mulheres, tendo em conta o seu menor tempo de contribuição


segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Info 988 - Dizer o Direito - STF

 É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja que os serviços públicos de saneamento e de abastecimento de água serão prestados por pessoas jurídicas de direito público ou por sociedade de economia mista sob controle acionário e administrativo, do Poder Público Estadual ou Municipal.

Compete aos Municípios a titularidade dos serviços públicos de saneamento básico. Assim, a

eles cabe escolher a forma da prestação desses serviços, se diretamente ou por delegação à

iniciativa privada mediante prévia licitação. Isso é garantido pelo art. 30, I e IV, da CF/88.

Além disso, essa previsão da Constituição Estadual também viola o art. 175 da Constituição

Federal, que atribui ao poder público a escolha da prestação de serviços públicos de forma

direta ou sob regime de concessão ou permissão mediante prévia licitação.

STF. Plenário. ADI 4454, Rel. Cármen Lúcia, julgado em 05/08/2020 (Info 988 – clipping).


A CF/88 e a lei preveem que a “entidade de classe de âmbito nacional” possui legitimidade

para propor ADI, ADC e ADPF.

A jurisprudência do STF, contudo, afirma que apenas as entidades de classe com associados

ou membros em pelo menos 9 (nove) Estados da Federação dispõem de legitimidade ativa

para ajuizar ação de controle abstrato de constitucionalidade.

Assim, não basta que a entidade declare no seu estatuto ou ato constitutivo que possui caráter

nacional. É necessário que existam associados ou membros em pelo menos 9 (nove) Estados

da Federação. Isso representa 1/3 dos Estados-membros/DF.

Trata-se de um critério objetivo construído pelo STF com base na aplicação analógica da Lei

Orgânica dos Partidos Políticos (art. 7º, § 1º, da Lei nº 9.096/95).

STF. Plenário. ADI 3287, Rel. Marco Aurélio, Relator p/ Acórdão Ricardo Lewandowski, julgado em

05/08/2020 (Info 988 – clipping).


A tomada de contas especial é a medida adequada para se alcançar o reconhecimento

definitivo das irregularidades detectadas. Só a partir daí é que se permite a inscrição do ente

nos cadastros de restrição ao crédito organizados e mantidos pela União.

O processo de contas é essencial para a apuração de responsabilidades. Não se pode impor

sanção sem anterior identificação de responsáveis.

STF. Plenário. ACO 2910 AgR, Rel. Roberto Barroso, julgado em 29/06/2020 (Info 988 – clipping).


Paulo foi condenado pelo então Juiz Federal Sérgio Moro por crimes contra o sistema

financeiro nacional, no âmbito da operação que ficou conhecida como “Caso Banestado”.

A defesa pediu que o STF reconhecesse que o referido magistrado quebrou a imparcialidade

e, portanto, a sentença seria nula.

Houve um empate na 2ª Turma do STF e, diante disso, prevaleceu a posição mais favorável ao

réu. Assim, foi declarada a nulidade da sentença condenatória proferida nos autos do processo

penal, por violação à imparcialidade do julgador.

O simples fato de o juiz ter feito a homologação dos acordos de colaboração ou mesmo ter

realizado as oitivas dos colaboradores não tem o condão de configurar, por si só, a quebra de

sua imparcialidade para o julgamento do réu ao qual imputados ilícitos no âmbito dos

respectivos acordos.

Todavia, as circunstâncias particulares do caso concreto demonstram que o juiz se investiu na

função persecutória ainda na fase pré-processual, violando o sistema acusatório.


Ao se analisar as atas de depoimentos, percebe-se uma proeminência (um destaque) para a

realização de perguntas feitas pelo juiz ao interrogado. O papel do magistrado era apenas o de

fazer o controle da legalidade e voluntariedade do acordo de colaboração premiada. No

entanto, o que se percebe pelas perguntas realizadas é que o juiz ultrapassou a mera

realização dessa função e atuou diretamente reforçando a acusação.

Logo, não houve mera supervisão dos atos de produção de prova, mas o direcionamento e a

contribuição do magistrado para o estabelecimento e para o fortalecimento da tese

acusatória.

Além disso, ao final da instrução, depois das alegações finais, o magistrado ordenou a juntada

de documentos diretamente relacionados com os fatos criminosos imputados aos réus, sem

pedido do Ministério Público ou da defesa.

Depois, ao sentenciar, ele utilizou expressamente tais elementos para fundamentar a

condenação.

Mesmo que se pudesse invocar, em tese, a possibilidade jurídica da produção de prova de

ofício pelo julgador com base no art. 156 do CPP, na situação dos autos, sequer é possível falar

verdadeiramente em produção probatória. Os documentos juntados não poderiam ter sido

utilizados para a formação do juízo de autoria e materialidade das imputações, uma vez

encerrada a instrução processual.

STF. 2ª Turma. RHC 144615 AgR/PR, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes,

julgado em 25/8/2020 (Info 988).


O relator ressaltou que o estabelecimento de balizas legais para o acordo é uma opção do

nosso sistema jurídico, para garantir a isonomia e evitar a corrupção dos imputados, mediante

incentivos desmesurados à colaboração, e dos próprios agentes públicos, aos quais se daria

um poder sem limite sobre a vida e a liberdade dos imputados

É preciso respeitar a legalidade, visto que as previsões normativas caracterizam limitação ao

poder negocial no processo penal.

No caso de ilegalidade manifesta (evidente) em acordo de colaboração premiada, o Poder

Judiciário deve agir para a efetiva proteção de direitos fundamentais.

O acordo de colaboração premiada é meio de obtenção de prova. Portanto, trata-se de instituto

de natureza semelhante, por exemplo, à interceptação telefônica.

O STF reconheceu, várias vezes, a ilegalidade de atos relacionados a interceptações

telefônicas. Logo, não há motivo para afastar essa possibilidade em ilegalidades que

permeiam acordos de colaboração premiada.

STF. 2ª Turma. HC 142205, Rel. Gilmar Mendes, julgado em 25/08/2020 (Info 988).



domingo, 18 de outubro de 2020

Informativo n.º 994/STF


É inconstitucional norma estadual que dispõe sobre a implantação de instalações industriais destinadas à produção de energia nuclear no âmbito espacial do território estadual.

 

Ao dispor sobre a partilha de competências estatais, a Constituição Federal (CF) outorgou à União, em caráter privativo, a prerrogativa de legislar sobre “atividades nucleares de qualquer natureza” (CF, art. 22, XXVI) (1).

Não obstante a indiscutível repercussão ambiental da utilização da energia nuclear, a própria CF excepcionou — dentre os diversos aspectos relacionados à competência comum partilhada entre ela e os Estados-membros e o Distrito Federal referentes à proteção ao meio ambiente e ao combate à poluição — a disciplina normativa pertinente às atividades e instalações nucleares, cuja regulamentação está inserida no domínio legislativo privativo da União.

A norma fundada no art. 7º, XXXIII, da Constituição Federal (CF) (1), na alteração que lhe deu a Emenda Constitucional (EC) 20/1998, tem plena validade constitucional. Logo, é vedado “qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos”.

 

O texto constitucional atribui à família, à sociedade e ao Estado o dever de assegurar, às crianças e aos adolescentes, em atenção e respeito à sua peculiar condição de pessoa em desenvolvimento, as condições materiais, afetivas, sociais e psicológicas necessárias ao acesso e à proteção ao direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Também lhes incumbe o dever de colocar a criança e o adolescente a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão [CF, art. 227 (2)].

 

Atendendo às diretrizes de caráter protetivo fundadas no art. 227, a EC 20/1998 modificou os critérios etários que definem a idade mínima para o regular início de atividades laborais. No desempenho de seu poder reformador, o Congresso Nacional proibiu a exploração de natureza estritamente econômica do trabalho infantil. As sequelas físicas, emocionais e sociais infligidas à criança e ao adolescente em decorrência da exploração do trabalho infantil, justificam a proteção especial e prioritária destinada a esse grupo vulnerável.

 

A temática referente ao trabalho infantil é objeto de diversos instrumentos convencionais no plano internacional, notadamente a Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) (Convenção sobre Idade Mínima de Admissão ao Emprego, 1973) e a Convenção 182 da OIT (Convenção sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil, 1999), ambas formalmente incorporadas ao direito positivo interno. Perante a Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil assumiu o compromisso de erradicar todas as formas de trabalho infantil até 2025 [Meta 8.7 da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável (3)].

 

A elevação da idade mínima para o trabalho do adolescente promovida pela EC 20/1998, além estar em plena conformidade com os princípios e diretrizes que orientam a doutrina da proteção integral — diretriz estruturante da CF de 1988 (art. 227) — acha-se, ainda, em harmonia com os objetivos e os postulados fundamentais da República [CF, art. 3º, IV (4)] e com os princípios básicos extraídos da ordem jurídica internacional.

 

Ademais, a cláusula que proíbe o retrocesso em matéria social traduz, no processo de sua concretização, verdadeira dimensão negativa pertinente aos direitos sociais, impedindo, em consequência, que os níveis de concretização dessas prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser reduzidos, degradados ou suprimidos.

 

Trata-se, na espécie, de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra a parte final do inciso XXXIII do art. 7º da CF, na redação dada pela EC 20/1998. A confederação requerente buscava o restabelecimento do texto anterior do dispositivo constitucional, que determinava a “proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de quatorze anos, salvo na condição de aprendiz”.

 

O Plenário julgou o pedido improcedente e confirmou a validade da norma questionada.

É constitucional norma estadual que dispõe sobre a obrigatoriedade de rotulagem em produtos de gêneros alimentícios destinados ao consumo humano e animal, que sejam constituídos ou produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, no percentual igual ou superior a 1%, no âmbito do Estado federado (Lei 14.274/2010 do Estado de São Paulo) (1).

 

No modelo federativo brasileiro, estabelecidas pela União as normas gerais para disciplinar sobre direito à informação em matéria de rotulagem de produtos transgênicos [Lei 11.105/2005, art. 40 (2); Decreto 5.591/2005, art. 91 (3); e Decreto 4.680/2003, art. 2º (4)], compete aos Estados [Constituição Federal (CF), art. 24, V, XII e §§1º a 4º] (5), além da supressão de eventuais lacunas, a previsão de normas destinadas a complementar a norma geral e a atender suas peculiaridades locais, respeitados os critérios: (i) da preponderância do interesse local, (ii) do exaurimento dos efeitos dentro dos respectivos limites territoriais — até mesmo para se prevenir conflitos entre legislações estaduais potencialmente díspares — e (iii) da vedação da proteção insuficiente.

 

Nesse contexto, a regulamentação dos critérios para a obrigatoriedade do dever de rotulagem dos produtos derivados ou de origem transgênica, como o limite de percentual igual ou superior a 1%, não excede os limites da competência suplementar dos estados, no tocante a essa matéria.

 

Isso porque, em primeiro lugar, o diploma estadual não afeta diretamente relações comerciais e consumeristas que transcendam os limites territoriais do ente federado. Exaurem-se os efeitos diretos da incidência das suas normas no território estadual e traduzem escolhas legítimas do legislador adequadamente amparadas nos interesses do consumidor, de densificação do direito à informação clara e adequada, e da proteção e defesa da saúde, atendidos, assim, os critérios do exaurimento dentro dos limites territoriais e da preponderância do interesse local.

 

Em segundo lugar, não há nada na lei que represente relaxamento das condições mínimas (normas gerais) de segurança exigidas na legislação federal para o dever de informação nos rótulos dos produtos de origem transgênica. Ao contrário, o que se verifica é a implementação de critério mais protetivo e favorável ao consumidor e à proteção do direito à saúde, não comportando censura sob o prisma da vedação à proteção insuficiente.

 

A possibilidade de o Estado federado instituir regras de proteção efetiva ao consumidor deriva de atribuição legislativa que lhe é conferida pelo arts. 24, V e VIII, combinado com o §2º do mesmo dispositivo da CF (6), e, consequentemente, ao fazê-lo não invadiu área reservada à União, tendo em vista que a esta apenas cabe legislar sobre normas gerais de produção e consumo e responsabilidade por dano ao consumidor, cabendo à unidade federada – vez que existe legislação federal a respeito do assunto – suprir os vácuos normativos.

 

No caso, trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, objetivando a declaração de inconstitucionalidade da Lei 14.274/2010 do Estado de São Paulo, que dispõe acerca da rotulagem de produtos transgênicos no Estado de São Paulo e dá outras providências.

 

Com entendimento acima exposto, o Plenário, por maioria, julgou improcedentes os pedidos formulados na ação direta de inconstitucionalidade.

É constitucional o tipo penal que prevê o crime de fuga do local do acidente [Código de Trânsito Brasileiro (CTB) art. 305] (1).   

A evasão do local do acidente não constitui exercício do direito ao silêncio ou do princípio do nemo tenetur se detegere. Essas garantias apenas limitam o Estado de impor a colaboração ativa do condutor do veículo envolvido no acidente para produção de provas que o prejudique.

A escolha do legislador infraconstitucional está em consonância com o escopo da regra convencional sobre trânsito de “aumentar a segurança nas rodovias mediante a adoção de regras uniformes de trânsito”.

O conjunto de leis no sentido do recrudescimento das regras de conduta no trânsito decorre da política criminal que visa acoimar a lamentável e alarmante situação que envolvem os acidentes de trânsito e que resultam, invariavelmente, mortes e graves lesões. A identificação dos envolvidos constitui fator imprescindível para consecução da finalidade da norma de regência.

Nessa dimensão, é concedido ao condutor uma série de direitos resultantes da autorização conferida pelo Estado, mas que, a seu lado, obrigações são irrogadas e dentre elas, encontra-se a de permanecer no local do acidente para que seja identificado. Ressalte-se que a permanência no local do acidente não comporta ilação de confissão de autoria delitiva ou de responsabilidade pelo sinistro, mas tão somente a sua identificação.

Com esse entendimento, o Plenário, por maioria, declarou a constitucionalidade do tipo penal descrito no art. 305 do CTB e julgou procedente a ação declaratória.

A exigência de garantia para o exercício da profissão de leiloeiro, prevista nos artigos 6º a 8º do Decreto 21.981/1932, é compatível com o art. 5º, XIII, da Constituição Federal de 1988 (CF) (1).

O art. 5º, XIII, da CF é norma constitucional de eficácia contida. Por isso, o legislador ordinário pode restringir o alcance da liberdade de exercício de qualquer trabalho nela prevista, a fim de disciplinar certas atividades cuja prestação possa, por falta de técnica, atingir negativamente a esfera de outros indivíduos ou de valores ou interesses da própria sociedade.

Entretanto, a legitimidade da atuação legislativa no campo do exercício do trabalho deve ser limitada ao indispensável para viabilizar a proteção de outros bens jurídicos de interesse público igualmente resguardados pela própria Constituição, como a segurança, a saúde, a ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio, a proteção especial da infância e outros.

No caso, o leiloeiro lida diariamente com o patrimônio de terceiros, de forma que a prestação de fiança como condição para o exercício de sua profissão busca reduzir o risco de dano ao proprietário, o que reforça o interesse social da norma protetiva, bem como justifica a limitação para o exercício da profissão.

Com esse entendimento, ao apreciar o Tema 455 da repercussão geral, o Plenário, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário.

Surge constitucional lei de iniciativa parlamentar a criar conselho de representantes da sociedade civil, integrante da estrutura do Poder Legislativo, com atribuição de acompanhar ações do Executivo.

Isso porque inexiste criação de cargos, funções ou empregos públicos da Administração direta ou autárquica a ensejar a reserva de iniciativa legislativa prevista no art. 61, § 1º, II, a, da Constituição Federal (CF) (1).

O respeito à independência dos Poderes não pode significar exclusividade do Executivo na atividade criativa, considerados arranjos institucionais para melhor desempenho na missão constitucional. Na Carta da República, não são encontrados parâmetros a impedirem a instituição, pelo Legislativo, de novos mecanismos voltados ao exercício da atividade de controle. Muito menos blindagem destinada a proteger, do escrutínio do povo, os administradores da coisa pública.

Envolvida participação da sociedade no acompanhamento da gestão pública, com densidade democrática elevada, o Supremo há de adotar postura de deferência à solução jurídica encontrada pelos formuladores. Em jogo faz-se a legitimação institucional, por parte do Legislativo, para a tomada de decisão. O Parlamento é a arena preferencial de deliberação na democracia representativa, de modo que, ao prever, em âmbito local, a existência de determinado colegiado enquanto mecanismo de atuação direta da sociedade civil, no acompanhamento da gestão da coisa pública, acaba por dar, mediante a institucionalização de espaços de participação social, concretude ao que se pode denominar “espírito de 1988” – a ser levado em conta, linear e indistintamente, por todos os Poderes da República.

Cumpre à Casa Legislativa atuar no âmbito da prerrogativa que lhe é própria – discutir, em sede deliberativa, fiscalizatória e legiferante, os grandes temas nacionais e as diretrizes da atividade estatal na condução de políticas públicas.

Com esse entendimento, ao apreciar o Tema 1040 da repercussão geral, o Plenário, por maioria, deu provimento parcial a recurso extraordinário para assentar a higidez constitucional dos arts. 54 e 55, caput, da Lei Orgânica do Município de São Paulo. Deu interpretação conforme a todos os incisos do citado art. 55, bem assim, no tocante à Lei municipal 13.881/2004, aos incisos IV, VIII, IX, X, XIII, XIV, XV e XVI do art. 9º, para não ter como vinculativa ou coercitiva a atuação do Conselho, ao § 1º do art. 12 e ao art. 23, assentando caber ao Legislativo firmar convênios e organizar curso de capacitação. Ainda quanto à Lei 13.881/2004, concluiu pela inconstitucionalidade das expressões “complementar”, contida no inciso VI do art. 2º; “através da Subprefeitura”, constante do § 2º do art. 20; dos parágrafos 3º do art. 12 e 2º do art. 15; do título do Capítulo VII — “Da Responsabilidade do Poder Executivo” —; dos arts. 22 e 25, declarando compatíveis com a Lei Maior os demais.

É inconstitucional, por transgressão ao princípio da isonomia entre homens e mulheres [Constituição Federal (CF), art. 5º, I], a exigência de requisitos legais diferenciados para efeito de outorga de pensão por morte de ex-servidores públicos em relação a seus respectivos cônjuges ou companheiros/companheiras (CF, art. 201, V).

Portanto, contraria o referido postulado constitucional exigir, para concessão da pensão por morte ao cônjuge varão supérstite, a comprovação de invalidez e de dependência econômica não exigidos à mulher ou companheira. Isso porque estudos recentes do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) revelam a importância das mulheres como “chefes de família”, o que torna completamente ultrapassada a presunção de dependência econômica da mulher em relação a seu cônjuge ou companheiro a justificar a mencionada discriminação.

No caso, a atual lei que disciplina o regime de previdência social dos servidores públicos do estado do Rio Grande do Sul (Lei Complementar estadual 15.142/2018) revogou expressamente a Lei estadual 7.672/1982, que exigia essa comprovação de invalidez e de dependência econômica do cônjuge varão para o recebimento de pensão por morte. Assim, eliminou qualquer fator de discriminação entre homens e mulheres e consagrou, de maneira explícita, a presunção de dependência econômica do cônjuge ou companheiro/companheira, sem nenhuma ressalva concernente ao gênero do beneficiário.

Ademais, não há ofensa ao princípio da fonte de custeio, eis que o argumento relativo à necessária indicação de contrapartidacomo condição para fazer cumprir o princípio constitucional da igualdadenão se justifica, por tratar-se de benefício já instituído, sem que a ele corresponda aumento do valor pago. As contribuições previdenciárias continuam a ser adimplidas pelos respectivos segurados, independentemente do gênero a que pertencem, alimentadas por alíquotas estáveis e com idêntico índice percentual, sem que se registre aumento no valor ou no quantum do respectivo benefício de ordem previdenciária.

O art. 201, V, da CF é preceito autoaplicável, revestido de aplicabilidade direta, imediata e integral, qualificando-se como estrutura jurídica dotada de suficiente densidade normativa, a tornar prescindível qualquer mediação legislativa concretizadora.

No julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta para questionar a validade de leis que criam cargos em comissão, ao fundamento de que não se destinam a funções de direção, chefia e assessoramento, o Tribunal deve analisar as atribuições previstas para os cargos.

 

Na fundamentação do julgamento, o Tribunal não está obrigado se pronunciar sobre a constitucionalidade de cada cargo criado, individualmente.

 

Os cargos em comissão de livre nomeação, conforme preceitua a Constituição Federal (CF), destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento (CF, art. 37, V) (1).

Somente após a apreciação das descrições das atividades dos cargos públicos na lei é que se poderá afirmar sua compatibilidade com a norma constitucional (nacional ou estadual) que estabelece os casos e as hipóteses de cargos em comissão.

Desse modo, instaurado o controle abstrato de constitucionalidade no âmbito de tribunal de justiça para a análise da higidez constitucional de lei municipal que cria cargos em comissão, a corte local deve examinar as atribuições dos cargos em comissão.

Além disso, ao apreciar o Tema 339 da repercussão geral, o Plenário definiu que o art. 93, IX, da CF exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas. Assim, a corte de origem não está obrigada, na fundamentação do acórdão que julga a ação de inconstitucionalidade, a manifestar-se sobre cada cargo, individualmente.

No caso, trata-se de ação direta para verificação da compatibilidade, com dispositivos de constituição estadual, de leis municipais que criaram cargos públicos de provimento em comissão, que, em tese, não seriam destinados a funções de chefia, direção e assessoramento. O tribunal de justiça julgou procedente em parte o pedido, afirmando, em suma, não ser possível a verificação das atribuições dos cargos para se concluir no sentido da inconstitucionalidade das normas. O acórdão foi impugnado por meio de embargos de declaração.

Com base nesse entendimento, o Plenário, ao apreciar o Tema 670 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário, em maior extensão, para que os autos retornem ao tribunal de origem, para novo julgamento dos embargos de declaração.

Toda pessoa que sofra prisão em flagrante — qualquer que tenha sido a motivação ou a natureza do ato criminoso, mesmo que se trate de delito hediondo — deve ser obrigatoriamente conduzida, “sem demora”, à presença da autoridade judiciária competente, para que esta, ouvido o custodiado “sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão” e examinados os aspectos de legalidade formal e material do auto de prisão em flagrante, possa: (i) relaxar a prisão, se constatar a ilegalidade do flagrante, (ii) conceder liberdade provisória, se estiverem ausentes as situações referidas no art. 312 do Código de Processo Penal (CPP) (1) ou se incidirem, na espécie, quaisquer das excludentes de ilicitude previstas no art. 23 do Código Penal (CP) (2), ou, ainda, (iii) converter o flagrante em prisão preventiva, se presentes os requisitos dos arts. 312 e 313 (3) do CPP.

A audiência de custódia (ou de apresentação) constitui direito público subjetivo, de caráter fundamental, assegurado por convenções internacionais de direitos humanos a que o Estado brasileiro aderiu, já incorporadas ao direito positivo interno (Convenção Americana de Direitos Humanos e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos). Traduz prerrogativa não suprimível assegurada a qualquer pessoa. Sua imprescindibilidade tem o beneplácito do magistério jurisprudencial (ADPF 347 MC) e do ordenamento positivo doméstico [Lei 13.964/2019 e Resolução 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)].

A ausência da realização da audiência de custódia qualifica-se como causa geradora da ilegalidade da própria prisão em flagrante, com o consequente relaxamento da privação cautelar da liberdade. Ressalvada motivação idônea, o magistrado que deixar de promovê-la se sujeita à tríplice responsabilidade [CPP, art. 310, § 3º (4)].

No contexto da audiência de custódia, é legítima a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva somente se e quando houver pedido expresso e inequívoco por parte do Ministério Público, da autoridade policial ou, se for o caso, do querelante ou do assistente do Parquet.

A reforma introduzida pela Lei 13.964/2019 (“Lei Anticrime”) modificou a disciplina referente às medidas de índole cautelar. Ao suprimir a expressão “de ofício” que constava do art. 282, §§ 2º e 4º, e do art. 311 do CPP (5), a lei vedou, de forma absoluta, a decretação da prisão preventiva sem prévio requerimento. Foi suprimida a possibilidade de o magistrado ordenar, sponte sua, a imposição de prisão preventiva. Assim, não é possível a decretação ex officio de prisão preventiva em qualquer situação (em juízo ou no curso de investigação penal), inclusive no contexto de audiência de custódia. Tornou-se inviável a conversão de ofício, mesmo na hipótese a que se refere o art. 310, II, do CPP (6).

Independentemente da gravidade em abstrato do crime, não se presume a configuração dos pressupostos e dos fundamentos referidos no art. 312 do CPP, que hão de ser adequada e motivadamente comprovados em cada situação ocorrente. Mostra-se inconcebível que se infira do auto de prisão em flagrante, ato de natureza meramente descritiva, a existência de representação tácita ou implícita da autoridade policial a fim de convertê-la em prisão preventiva.

Em matéria processual penal, inexiste, em nosso ordenamento jurídico, o poder geral de cautela dos juízes, notadamente em tema de privação e/ou restrição da liberdade das pessoas. Consequentemente, é vedada a adoção de provimento cautelares inominados ou atípicos — em detrimento de investigado, acusado ou réu —, em face dos postulados constitucionais de tipicidade processual e da legalidade estrita.

Trata-se, na espécie, de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça que indeferiu o pedido cautelar lá formulado em sede de ação constitucional de mesma natureza. No caso, magistrado de primeira instância afirmou não vislumbrar como realizar audiência de custódia dos pacientes, haja vista a situação de pandemia do novo coronavírus (Covid-19). Além disso, registrou que a audiência seria realizada em momento oportuno e converteu de ofício as prisões em flagrante em preventivas.

A Segunda Turma não conheceu da impetração, mas concedeu, de ofício, a ordem de habeas corpus para invalidar, por ilegal, a conversão ex officio das prisões em flagrante dos ora pacientes em prisões preventivas, confirmando, em consequência, o provimento cautelar anteriormente deferido.

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MAGISTRADOS APOSENTADOS. ADICIONAL DE 20% PREVISTO NO ART. 184, II, DA LEI 1.711/1952. INCOMPATIBILIDADE COM O REGIME REMUNERATÓRIO DO SUBSÍDIO. Recurso Extraordinário a que se dá provimento. Tema 690, fixada a seguinte tese de repercussão geral: - É inconstitucional o pagamento do adicional de 20% previsto no art. 184, II, da Lei 1.711/1952 a desembargadores, após a adoção do subsídio como forma remuneratória. - A supressão do adicional não pode representar decesso remuneratório, em face do princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos, hipótese em que a parcela deve ser absorvida por reajustes salariais futuros.

MAGISTRATURA – PROMOÇÃO POR ANTIGUIDADE – PRECEDÊNCIA – REMOÇÃO. A promoção na magistratura por antiguidade precede a mediante remoção.

IMPORTAÇÃO – TRIBUTO E MULTA – MERCADORIA – DESPACHO ADUANEIRO – ARBITRAMENTO – DIFERENÇA – CONSTITUCIONALIDADE. Surge compatível com a Constituição Federal o condicionamento, do desembaraço aduaneiro de bem importado, ao pagamento de diferença tributária apurada por arbitramento da autoridade fiscal.

CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. COFINSIMPORTAÇÃO. MAJORAÇÃO DA ALÍQUOTA EM UM PONTO PERCENTUAL. APROVEITAMENTO INTEGRAL DOS CRÉDITOS OBTIDOS COM O PAGAMENTO DO TRIBUTO. VEDAÇÃO. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 8º, § 21, DA LEI 10.865/2004, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 12.715/2012, E DO § 1º-A DO ARTIGO 15 DA LEI 10.865/2004, INCLUÍDO PELA LEI 13.137/2015. Recurso Extraordinário a que se nega provimento. Tema 1047, fixada a seguinte tese de repercussão geral: I - É constitucional o adicional de alíquota da Cofins-Importação previsto no § 21 do artigo 8º da Lei nº 10.865/2004. II - A vedação ao aproveitamento do crédito oriundo do adicional de alíquota, prevista no artigo 15, § 1º-A, da Lei nº 10.865/2004, com a redação dada pela Lei 13.137/2015, respeita o princípio constitucional da não cumulatividade.

PIS – COFINS – ATIVO IMOBILIZADO – CREDITAMENTO – LIMITAÇÃO – LEI Nº 10.865/2004. Surge inconstitucional, por ofensa aos princípios da não cumulatividade e da isonomia, o artigo 31, cabeça, da Lei nº 10.865/2004, no que vedou o creditamento do PIS e da COFINS, relativamente ao ativo imobilizado adquirido até 30 de abril de 2004.

Recurso Extraordinário. Repercussão geral. Direito Tributário. Incidência do ICMS ou do ISS. Operações mistas. Critério objetivo. Definição de serviço em lei complementar. Medicamentos produzidos por manipulação de fórmulas, sob encomenda, para entrega posterior ao adquirente, em caráter pessoal. Subitem 4.07 da lista anexa à LC nº 116/03. Sujeição ao ISS. Distinção em relação aos medicamentos de prateleira, ofertados ao público consumidor, os quais estão sujeitos ao ICMS. 1. A Corte tradicionalmente resolve as ambiguidades entre o ISS e o ICMS com base em critério objetivo: incide apenas o primeiro se o serviço está definido por lei complementar como tributável por tal imposto, ainda que sua prestação envolva a utilização ou o fornecimento de bens, ressalvadas as exceções previstas na lei; ou incide apenas o segundo se a operação de circulação de mercadorias envolver serviço não definido por aquela lei complementar. 2. O critério objetivo pode ser afastado se o legislador complementar definir como tributáveis pelo ISS serviços que, ontologicamente, não são serviços ou sempre que o fornecimento de mercadorias seja de vulto significativo e com efeito cumulativo. 3. À luz dessas diretrizes, incide o ISS (subitem 4.07 da Lista anexa à LC nº 116/06) sobre as operações realizadas por farmácias de manipulação envolvendo o preparo e o fornecimento de medicamentos encomendados para posterior entrega ao fregueses, em caráter pessoal, para consumo; incide o ICMS sobre os medicamentos de prateleira ofertados ao público consumidor e produzidos por farmácias de manipulação. 4. Fixação da seguinte tese para o Tema nº 379 da Gestão por temas de repercussão geral: “Incide ISS sobre as operações de venda de medicamentos preparados por farmácias de manipulação sob encomenda. Incide ICMS sobre as operações de venda de medicamentos por elas ofertados aos consumidores em prateleira.” 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento.

EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão geral. Direito Tributário. Imunidade. Operações de exportação. Artigo 155, § 2º, X, a, CF. ICMS. Operações e prestações no mercado interno. Não abrangência. Possibilidade de cobrança do ICMS. Manutenção e aproveitamento dos créditos. 1. A Corte, sempre que se manifestou sobre as imunidades constitucionais, se ateve às finalidades constitucionais às quais estão vinculadas as mencionadas regras. Nas operações de exportação, é clara a orientação quanto à impossibilidade de, a pretexto de se extrair da regra imunitória o máximo de efetividade, se adotar uma interpretação ampliativa, de modo a se abarcarem fatos, situações ou objetos a priori não abrangidos pela expressão literal do enunciado normativo. 2. Ao estabelecer a imunidade das operações de exportação ao ICMS, o art. 155, § 2º, X, da Constituição se ocupa, a contrario sensu, das operações internas, pressupondo a incidência e estabelecendo o modo pelo qual o ônus tributário é compensado: mediante a manutenção e o aproveitamento dos créditos respectivos. 3. Caso houvesse imunidade para as operações internas, de modo que não fosse cobrado o ICMS em nenhuma das etapas anteriores à exportação, seria inútil e despropositada a regra de manutenção e aproveitamento de créditos. 4. Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso extraordinário. 5. Tese do Tema nº 475 da Gestão por Temas da Repercussão Geral: “A imunidade a que se refere o art. 155, § 2º, X, a, da CF não alcança operações ou prestações anteriores à operação de exportação.”

Recurso extraordinário. Repercussão geral. Normas gerais de Direito Tributário. Artigo 146, III, b, da CF. Artigo 170 do CTN. Norma geral em matéria de compensação. Compensação de ofício. Artigo 73, parágrafo único (incluído pela Lei nº 12.844/13), da Lei nº 9.430/96. Débitos parcelados sem garantia. Suspensão da exigibilidade do crédito (art. 151, VI, do CTN). Impossibilidade de compensação unilateral. Inconstitucionalidade da expressão “ou parcelados sem garantia”. 1. O art. 146, III, b, da Constituição Federal dispõe caber a lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários. Nesse sentido, a extinção e a suspensão do crédito tributário constituem matéria de norma geral de Direito Tributário, sob reserva de lei complementar. A compensação vem prevista no inciso II do art. 156 do CTN como forma de extinção do crédito tributário e deve observar as peculiaridades estabelecidas no art. 170 do Código Tributário Nacional. 2. O art. 170 do CTN, por si só, não gera direito subjetivo a compensação. A lei complementar remete a lei ordinária a disciplina das condições e das garantias, cabendo a lei autorizar a compensação de créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo, observados os institutos básicos da tributação previstos no Código Tributário Nacional. 3. A jurisprudência da Corte já assentou que a compensação de ofício não viola a liberdade do credor e que o suporte fático da compensação prescinde de anuência ou acordo, perfazendo-se ex lege, diante das seguintes circunstâncias objetivas: (i) reciprocidade de dívidas, (ii) liquidez das prestações, (iii) exigibilidade dos débitos e (iv) fungibilidade dos objetos. Precedentes. 4. O art. 151, VI, do CTN, ao prever que o parcelamento suspende a exigibilidade do crédito tributário, não condiciona a existência ou não de garantia. O parágrafo único do art. 73 da Lei nº 9.430/96 (incluído pela Lei nº 12.844/13), ao permitir que o Fisco realize compensação de ofício de débito parcelado sem garantia, condiciona a eficácia plena da hipótese de suspensão do crédito tributário - no caso, o 'parcelamento' (CTN - art. 151, VI) - a condição não prevista em lei complementar. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento, mantendo-se o acórdão em que se declarou a inconstitucionalidade da expressão “ou parcelados sem garantia”, constante do parágrafo único do art. 73 da Lei nº 9.430/96, incluído pela Lei nº 12.844/13, por afronta ao art. 146, III, b, da Constituição Federal. 6. Tese do Tema nº 874 de repercussão geral: “É inconstitucional, por afronta ao art. 146, III, b, da CF, a expressão ’ou parcelados sem garantia’ constante do parágrafo único do art. 73, da Lei nº 9.430/96, incluído pela Lei nº 12.844/13, na medida em que retira os efeitos da suspensão da exigibilidade do crédito tributário prevista no CTN.”

DIREITO CONSTITUCIONAL. COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS – CVM. LIMITES DO PODER REGULAMENTAR. ATIVIDADE DE AUDITOR INDEPENDENTE. INCOMPATIBILIDADE COM A PRESTAÇÃO DE CONSULTORIA PARA A EMPRESA AUDITADA. CONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 23, INCISO II E PARÁGRAFO ÚNICO, 24, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, E 27, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, DA INSTRUÇÃO 308/1999, DA CVM. PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. O cerne da controvérsia diz respeito aos limites do poder regulamentar da CVM para editar, no âmbito do mercado de valores mobiliários, normas que envolvem o exercício da atividade profissional de auditor independente e das pessoas físicas e jurídicas a eles vinculadas. 2. O art. 23, II, e parágrafo único, e o art. 27, ambos da Instrução CVM 308/1999, vedam, ao auditor independente e às pessoas físicas e jurídicas a ele ligadas, a prestação de consultoria às mesmas empresas em que estejam realizando auditoria. 3. A Comissão de Valores Mobiliários - CVM, criada pela Lei 6.385/1976, tem natureza de entidade autárquica em regime especial, vinculada ao Ministério da Fazenda, e é legalmente responsável pela supervisão, disciplina e fiscalização do mercado brasileiro de valores mobiliários. 4. A Lei 6.385/1976 conferiu à CVM competência para o exercício do poder de polícia, no âmbito do mercado de valores mobiliários, inclusive no que tange às atividades de auditoria e aos serviços de consultoria. Essa competência específica da CVM de regular os serviços de auditoria e consultoria, que se extrai da própria Lei 6.385/1976, inclui necessariamente a de definir, por meio de critérios técnicos e de segurança, regras que preservem a objetividade e a independência da atuação do auditor no âmbito do mercado de valores mobiliários. 5. As regras da IN 308/1999, antes de configurar qualquer afronta ao direito de livre exercício da profissão ou da livre iniciativa, revelam medidas preventivas, adotadas no estrito cumprimento da função normativa e reguladora da CVM, em benefício da sociedade, tudo em observância aos princípios que regem a ordem econômica previstos no art. 170 da CF. 6. Recurso Extraordinário a que se dá provimento, para denegar a segurança pleiteada. Tema 969, fixada a seguinte tese de repercussão geral: “Os artigos 23 e 27 da Instrução 308/1999, da Comissão de Valores Mobiliários, ao estabelecerem restrições razoáveis, proporcionais e adequadas ao exercício da atividade de auditoria independente, prestada às companhias sujeitas à sua fiscalização, são constitucionais, à luz dos arts. 5º, incs. II e XIII, 84, incs. II e VI, 87, parágrafo único e inc. II, 88, 170 e 174 da Constituição Federal de 1988.”